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Quanto custa para o Brasil a revisão da meta climática apresentada pelo governo?

MMA mudou parâmetros relevantes que levantam dúvidas sobre o seu nível de ambição e capacidade de planejamento nas questões ambientais. Falta de clareza pode dificultar atração de investidores e recursos para o país

Raphaela Caçapava ·
20 de dezembro de 2020 · 4 anos atrás
O chanceler Ernesto Araújo, ministro das relações Exteriores, e o presidente da República, Jair Bolsonaro, durante a LVII Cúpula de Chefes de Estado do Mercosul. Foto: Isac Nóbrega/PR.

O Brasil, que já foi  protagonista mundial frente aos assuntos ambientais, caminha mais uma vez sob os olhares suspeitos da comunidade internacional. Isso porque o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, apresentou a nova meta climática ao Acordo de Paris, que permitirá ao Brasil poluir mais até 2030. A proposta original realizada pelo Brasil em 2015 considerava a taxa de emissão registrada em 2005 – que até então era de 2,1 bilhões de toneladas de CO2-, entretanto os números foram revistos e as emissões daquele ano foram atualizadas para 2,8 bilhões de toneladas. O novo acordo manteve o percentual de 43% de redução, porém não considerou a correção dos dados, o que elevou para 400 milhões de toneladas de gases do efeito estufa a mais do que a proposta inicial.

A Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura, movimento composto por mais de 260 representantes do agronegócio, sociedade civil, setor financeiro e academia, manifestou sua preocupação com a revisão da NDC (meta climática) apresentada pelo governo brasileiro às Nações Unidas. “A meta climática apresentada pelo Brasil o distancia do cumprimento dos objetivos estabelecidos no Acordo de Paris, pondo em risco os esforços globais para manter o aumento de temperatura média do planeta em, no máximo, 1,5° C até o fim deste século. Com isso, corremos um grave risco de agravar problemas já existentes, como alteração do ciclo de chuvas, escassez de água, perda da biodiversidade e de áreas férteis para a agricultura”, alertou  Marcello Brito, representante da Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura e presidente do conselho diretor da Associação Brasileira do Agronegócio (ABAG).

Além disso, o documento deixa de fora compromissos importantes assumidos em 2015, como zerar o desmatamento ilegal na Amazônia e reflorestar 12 milhões de hectares de florestas até 2030. A nova proposta inclui intenções, a partir de 2021, de zerar as emissões em 2060 desde que receba US$ 10 bilhões de outros países a partir do próximo ano.

Arte: Eli Nunes/Regra dos Terços.

“É positivo o fato de o Brasil ter anunciado uma meta de neutralizar suas emissões de carbono, mesmo que indicativa, mas não estão claros os parâmetros usados para tanto. Um maior engajamento com diversos atores na sociedade civil poderia apontar caminhos e meios de implementação, inclusive com possibilidades de antecipar o prazo de cumprimento”, destacou Brito.

O representante da Coalizão Brasil ainda reforça que o próprio documento cita mecanismos para a participação da sociedade como o Comitê Interministerial sobre Mudança do Clima e o Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas. “Infelizmente, não fomos consultados. Mas reforçamos que seguimos à disposição do Governo para contribuir”, completou.

O preço que o Brasil pode pagar com a revisão da NDC

Mais que os prejuízos ambientais causados pelo posicionamento, a nova meta climática pode causar perdas incalculáveis na atração de recursos financeiros para o país. “Investidores são avessos ao risco de perda e está cada vez mais claro que clima e meio ambiente são dois importantes fatores de risco.  Precisamos mostrar que existe um compromisso real com o combate à ilegalidade e com a implementação de leis, como Código Florestal, como forma de sinalizar aos investidores que é seguro e sustentável investir no Brasil”, explicou.

Os danos ao Brasil podem ir além da repulsa dos investidores. Para Brito, o país perde mais que investimentos: perde reputação, credibilidade e outros fatores fazem muita diferença em negociações internacionais, sejam elas diplomáticas ou comerciais.

Brasil polui a troco de nada

Desmatamento e queimadas são as principais fontes de emissões brasileiras. Foto: Amazônia Real/Flickr.

Na maior parte dos países, as emissões dos gases de efeito estufa vêm da geração de energia, indústria e transportes. Entretanto, no Brasil, não. “Nossas emissões vêm, em grande parte, de desmatamento e queimadas – atividades que não geram PIB ou inserção social. Ou seja, estamos emitindo a troco de nada, sendo que o agronegócio nacional já domina técnicas produtivas de baixo carbono que podem contribuir muito com nossas metas climáticas. Deveríamos ver o aumento de ambição como oportunidade e não como entrave”, indagou Brito.

País se afasta da liderança mundial da agenda

Prova de que a comunidade internacional não reagiu bem a revisão das metas brasileiras foi a exclusão do Brasil do evento das Organização das Nações Unidas (ONU), a Climate Ambition Summit. O encontro que reúne chefes  de estado de todo o mundo é uma reunião preparatória para a próxima Conferência das Partes da Convenção da ONU sobre Mudança do Clima, marcada para o ano que vem.

Uruguai, Argentina, Colômbia, Peru, Belize, Cuba, Costa Rica, Equador, Jamaica, Guatemala, Honduras, Panamá e Canadá ganharam espaço no palco virtual do evento. “O protagonismo do Brasil na agenda climática está diminuindo. Ficar fora do Climate Ambition Summit foi mais um sinal de alerta. Ficar fora de algo onde podemos ser líderes absolutos não nos faz sentido”, finalizou Brito.

*Raphaela Caçapava, da Agência Regra dos Terços, especial para ((o))eco.

 

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