Os povos indígenas, desde o princípio, lutam pela conquista e manutenção do direito aos territórios originários, à saúde, à cultura e a defesa do meio ambiente e, potencializando toda essa luta, está a busca pelo direito à comunicação. Ao ser protagonista na produção de informações de qualidade sobre os diferentes povos, o movimento indígena fortalece a cidadania dos povos que representa e democratiza a comunicação, oferecendo pluralidade de enfoques e diferentes olhares.
Esta é a questão central do artigo “A importância das notícias produzidas pelo movimento indígena na luta por direitos”, estudo desenvolvido no âmbito do Grupo de Pesquisa em Jornalismo Ambiental (CNPq/UFRGS), que analisa as notícias produzidas e publicadas pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab). A pesquisa identifica importantes aspectos nas notícias das organizações, sendo eles: a intensa e constante luta dos povos indígenas pelo seus direitos; a contextualização sócio-histórica e problematização das temáticas; e a valorização das características étnicas e das fontes indígenas.
O artigo analisa notícias do primeiro ano de pandemia da covid-19, e destaca que a divulgação de dados oficiais das organizações indígenas e a denúncia de descaso público com saúde dos povos originários foram cruciais para a conquista de algumas reivindicações. Como exemplo, o artigo cita o direito à vacinação de todos os indígenas como público prioritário, que inicialmente não era garantida a população que estivesse morando em contexto urbano e em terras não homologadas. “Percebe-se o quanto as práticas comunicacionais realizadas pelo movimento indígena, baseadas no repasse de informações sérias e contextualizadas, são importantes para legitimar e para dar credibilidade à luta indígena”, destaca o estudo.
A presença dos povos indígenas na mídia é fundamental para a concreta visibilidade política, para que as pautas e as vozes indígenas sejam propagadas e cheguem ao conhecimento da sociedade. Sem a comunicação em que os povos indígenas são protagonistas há o risco de deixar a proteção das comunidades tradicionais e do meio ambiente para os não-indígenas, o que, historicamente, não têm dado muito certo.
Fazer a comunicação de movimentos engajados politicamente no padrão jornalístico é desafiador, mas é possível, e muito necessário. Pautar a mídia tradicional e estar no mesmo campo minado de infinitas informações da internet é ocupar esse espaço com uma via de pensamento alternativa à globalização neoliberal. É oferecer à sociedade diferentes narrativas, olhares e modos de vida.
Neste sentido, o movimento indígena vem se preparando para a sua atuação na COP-30, que acontece em novembro de 2025, em Belém, Pará. Pela primeira vez no Brasil, a realização do evento tem mobilizado movimentos sociais ligados aos povos indígenas e tradicionais para que tenham seu espaço e vozes respeitadas e ouvidas durante o evento.
Na última semana, de 2 a 5 de junho, estiveram reunidos em Brasília lideranças indígenas de nove países da Bacia Amazônica para a Pré-COP Indígena. No encontro foi lançada a primeira NDC (Contribuição Nacionalmente Determinada) indígena, construída a partir de vivências e soluções dos povos originários como contribuição para o combate à emergência climática.
No documento, é declarado o protagonismo intencional e definitivo na COP-30, sob o entendimento de que “não haverá futuro possível sem os Povos Indígenas no centro das decisões globais.” Também, é afirmado que o Estado deve ter respeito aos direitos indígenas e garantir a proteção dos territórios originários para assim ter estratégias de mitigação e adaptação mais eficazes.
A NDC será apresentada na Conferência de Clima de Bonn, este mês, e na COP-30, em novembro. A iniciativa é um exemplo notório de onde se pode chegar a comunicação indígena – liderada pela Coiab, com o apoio da Apib e da coalizão internacional G9 da Amazônia Indígena. As ações promovidas são possíveis pela presença política dessas organizações, que lutam pela visibilidade de suas causas.
A produção de conteúdo de comunicação estratégica, pensada como arma de luta política e social, passa pela constante atualização, monitoramento e interação com o público – e utiliza da mídia hegemônica ao mesmo tempo que se difere dela. Ao exemplo da divulgação da Pré-Cop, notícias na plataforma da Coiab e Apib demonstram engajamento político, ambiental e social. É notável também o reforço da identidade cultural e a valorização de fontes indígenas.
Nesse contexto, a comunicação é um campo e uma ferramenta de resistência política, que pode pressionar a sociedade de forma coletiva, pode pautar a mídia mainstream, chegar a novos espaços e a novos patamares na luta por direitos. É importante que o jornalismo seja um mediador entre o público e novas (ou ancestrais) narrativas, culturas e causas, e dê abertura consciente para a divulgação de uma comunicação diversa e inclusiva.
As opiniões e informações publicadas nas seções de colunas e análises são de responsabilidade de seus autores e não necessariamente representam a opinião do site ((o))eco. Buscamos nestes espaços garantir um debate diverso e frutífero sobre conservação ambiental.
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