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Ao negar pauta ambiental como prioritária, Brasil se isola do mundo, aponta Marina

Ex ministra do Meio Ambiente foi uma das participantes do 1º dia do Seminário Jornalistas em Diálogo, que teve papo sobre política ambiental e a cobertura jornalística na Amazônia – confira o que rolou

Redação ((o))eco ·
14 de setembro de 2020 · 4 anos atrás
A jornalista Daniela Chiaretti media conversa entre Marina Silva e a procuradora Ana Bragança. Foto: Reprodução

Nesta segunda-feira (14) teve início o Seminário Jornalistas em Diálogo, evento organizado pelo ((o))eco em parceria com o Imazon que trará discussões sobre temas como Amazônia, política ambiental, pecuária, mercado financeiro e muito jornalismo! A primeira mesa do seminário trouxe a ex ministra do Meio Ambiente, Marina Silva (REDE), e a procuradora do Ministério Público Federal, Ana Carolina Bragança. A conversa entre as duas, mediada pela jornalista Daniela Chiaretti, do Valor Econômico, abordou o desmonte ambiental promovido pela atual gestão federal e seus impactos no campo; o isolamento do Brasil no cenário global de combate à emergência climática; as articulações necessárias entre Estado, iniciativa privada e sociedade para tentar reverter esse quadro e possíveis saídas para a crise; e como o âmbito jurídico pode ser aliado da sociedade para deter os retrocessos.

“O contexto é de um mundo que se desloca para agenda da sustentabilidade. Nesse contexto, nós temos no Brasil um governo e políticas ambientais que estão completamente deslocadas, completamente isoladas com uma arrogância ignorante que causa prejuízo, vergonha, indignação e muito constrangimento. (…) O Brasil virou um pária ambiental, completamente na contramão de tudo isso”, analisa Marina Silva, que liderou o Ministério do Meio Ambiente entre 2003 e 2008.

Ela lembrou ainda das eleições presidenciais americanas, que ocorrem este ano, e que uma vitória do partido Democrata, que concorre com Joe Biden, isolará ainda mais o Brasil no cenário global no que diz respeito à postura diante da emergência climática, já que esse é um tema pelo qual mostrou apreço a candidatura de Biden, ao contrário do atual presidente americano e candidato à reeleição Donald Trump.

Marina fez ainda um resumo dos atos promovidos pelo presidente Jair Bolsonaro, que tem causado o desmonte da área ambiental. A militarização e a postura autoritária – marcas registradas dessa gestão – foram destacadas pela política, que citou a exclusão da sociedade civil de colegiados como o Conselho da Amazônia e comparou os orçamentos da Operação Verde Brasil 2, de 60 milhões de reais mensais, versus a previsão orçamentária do Ibama em todo ano, que é de 74 milhões de reais.

“A ação do presidente Bolsonaro, em primeiro lugar, é uma ação de militarização da política para a Amazônia, de retirada do controle civil, tanto do ponto de vista da pesquisa científica-tecnológica, quanto do ponto de vista dos instrumentos de fiscalização e controle, de planejamento, de estratégias de investimento para projetos de desenvolvimento”, indica Marina Silva.

Assista a mesa sobre os rumos da política ambiental no Brasil neste link

A procuradora Ana Bragança ressaltou a ação integrada do MPF – normalmente focada por estado – para estabelecer um combate a rede organizada de crime ambiental. A Força-Tarefa Amazônia, que teve início em agosto de 2018 e segue em curso, resultou no cumprimento de 516 medidas de investigação em 15 operações, além do ajuizamento de 18 ações penais. Ela reforça ainda o papel dos governos estaduais de desenvolver seus próprios planos de combate ao desmatamento e às queimadas, e de fazer essa fiscalização mesmo em áreas federais.
Ana exemplifica ainda como o discurso político negacionista e de enfraquecimento da legislação ambiental gera desdobramentos diretos no campo, através da desinformação e da ausência do Estado.

“Tem aparecido, cada vez mais, inclusive nos casos do dia a dia, essas falas de que nós [os invasores] invadimos uma unidade de conservação ou uma Terra Indígena ou uma terra pública porque foi dito que ela seria regularizada. Isso é uma coisa que 3-4 anos atrás não existia, ninguém falava para um fiscal do Ibama ou do ICMBio que entrou numa unidade de conservação porque aquilo ali não era mais unidade de conservação. Às vezes não é nem que foi prometido que não seria mais, às vezes o que é dito é não é mais, então que a gente pode entrar e invadir e demarcar nossos lotes. Isso é gritantemente uma ausência do Estado na prestação de informações atualizadas”, conta a procuradora.

Veja na íntegra a discussão da primeira mesa:

A vivência jornalística na Amazônia

Na segunda mesa do dia, o Seminário contou com a participação de dois jornalistas que atuam – e vivem – na região amazônica. Fundadora da agência de notícias Amazônia Real, Elaíze Farias foi acompanhada pelo jornalista freelancer Fábio Pontes, nascido e criado no Acre. Os dois trouxeram os desafios logísticos de fazer essa cobertura na Amazônia, da importância do olhar local, da desconstrução de estereótipos colonialistas promovidos por comunicadores do centro-sul do Brasil e de dar voz às populações locais, como indígenas e ribeirinhos. A conversa foi mediada pelo jornalista ambiental da agência Envolverde, Dal Marcondes.

“Temos que ter um jornalismo ambiental local, feito por pessoas que estão aqui e feita por pessoas que podem se comunicar com quem está aqui também”, afirma Fabio Pontes. “A gente tem que parar com essa visão de sempre estar escrevendo de fora para dentro, de cima pra baixo, eu acho que a gente tem que começar a dialogar com as populações locais, com a comunidade local. A gente tem que fazer jornalismo ambiental para quem está aqui”, reforça o jornalista, que acrescenta que ser lido pelos próprios moradores da região amazônica ainda é um desafio e objetivo perseguido por ele, assim como por Elaíze.

A fundadora da Amazônia Real destaca ainda a necessidade de vencer estereótipos sobre o modo de vida mais simples de ribeirinhos ou mesmo sobre os indígenas. E como a grande mídia é muito centrada no sudeste e cobre a Amazônia apenas quando algo extrapola a região Norte, como as queimadas de 2019 que viraram manchetes nacionais apenas quando a fumaça chegou em São Paulo.

“De 1 a 13 setembro de 2020, o estado do Amazonas registrou 2.801 focos de queimadas. No mesmo período do ano passado foram 1.354 focos. Cadê essa grande repercussão?”, critica Elaize.

Assista a mesa sobre vivências de jornalismo na Amazônia por quem está lá:

O Seminário Jornalistas em Diálogo, com duração de três dias, trará debates e profissionais com o propósito de capacitar comunicadores a abordar os temas socioambientais da atualidade. Este foi só o primeiro dia de evento, confira no site do Seminário a programação dos próximos dois dias e assista as mesas ao vivo nos canais de ((o))eco no Facebook e Youtube.

 

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Comentários 4

  1. Bazileuson Margarido diz:

    Parabéns! Dona Marina realmente é uma autoridade no assunto. Como ministra, o Brasil conseguiu se destacar como a melhor gestão ambiental do mundo.


    1. MP366/2007 diz:

      Margarido é aquele que colaborou com o racha do Ibama em 2007, via Medida Provisória, sem discussão alguma, na surdina, pra aplacar a ira que o Barba tava dos bagres do Madeira?


      1. Paulo diz:

        Mas continua este chororô. Muda o disco.
        Mexa-se. Estais em quais lutas ambientais, hoje, sr. MP366/2007.

        Nunca fui de governo algum, mas se não fosse esta sra. "margarido', como o sr. MP 366/2007 a chama, o PN da Serra do Itajaí, nunca teria ocorrido l. Preste atenção NUNCA, teria acontecido a existência do Parque Nacional da Serra do Itajaí por parte do governo federal.


        1. Paula T. diz:

          Então pela sua lógica, tem que comemorar se te roubarem um celular, mas deixarem a capa. Já que sem o roubo, a entrega da capa pelo ladrão NUNCA teria acontecido.