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Tem boi na reserva de Amanã

Na RDS, localizada no interior do Amazonas, pesquisadores do Instituto Mamirauá tentam alternativas para que a pecuária não avance sobre a floresta

Vandré Fonseca ·
9 de julho de 2017 · 7 anos atrás
Oficina reúne produtores de gado de Amanã. Objetivo é melhorar a produtividade. Foto: Instituto Mamirauá.
Oficina reúne produtores de gado de Amanã. Objetivo é melhorar a produtividade. Foto: Instituto Mamirauá.

Tefé (AM) — Na Reserva de Desenvolvimento Sustentável de Amanã, melhorar as condições de criação do gado é encarado como um desafio em favor do meio ambiente por pesquisadores do Instituto Mamirauá. De acordo com eles, não existem impedimentos legais para o gado em uma  RDS, ao contrário das restrições para outras categorias de unidades de conservação de uso sustentável ou não.

“As atividades que são desenvolvidas na reserva podem alterar o ambiente, desde que essa alteração seja reversível”, afirma a veterinária Paula Araújo, pesquisadora do instituto. As pesquisas desenvolvidas em Amanã buscam dar sustentabilidade a pecuária que já existe na região.

Um levantamento feito em 2010 pelo Instituto encontrou 735 cabeças de gado dentro a reserva, divididos entre 58 produtores. A criação é bastante rudimentar, pouco produtiva, com média de uma cabeça de gado por hectare. Para aumentar o rebanho, abrem-se novas áreas de pastagens.

Pesquisas desenvolvidas dentro do Projeto BioREC (Conservação e Uso Sustentável da Biodiversidade em Unidades de Conservação) do Instituto Mamirauá, financiado pelo Fundo Amazônia, buscam melhorar as técnicas da pecuária em Amanã, com vantagens. Além de melhorar a qualidade do rebanho, as propostas prevêem avanços ambientais, como preservação do solo, dispensa de fertilizantes e agrotóxicos e da derrubada de floresta para plantio de pasto.

A alternativa apresentada é o Pastoreio Racional Voisin (PRV), que não usa fertilizantes ou mecanização e prevê o rodízio do gado entre parcelas demarcadas na propriedade, de modo a evitar o esgotamento dos recursos disponíveis em cada uma delas. “O fato de não utilizar gradeação ou aração faz com que se mantenha a estabilidade da estrutura do solo”, afirma Paula Araújo. “Quando você mantém esta estabilidade, as camadas do solo, você consegue manter a vida que tem naquele solo”.

Oficina

Em junho, o Instituto reuniu 12 produtores de gado de Amanã, em uma oficina na fazenda Agda, onde é implementado um projeto experimental. Por lá, a meta é aproveitar apenas 9 dos 36 hectares de pasto já abertos para testar e desenvolver a técnica na região. E mudanças já começaram a ser feitas.

“Em um ano e meio, eu já vejo a recuperação dos animais, que estão saudáveis, a área de pasto recuperando, o solo com outro vigor de crescimento das gramíneas”, afirmou durante o proprietário da fazenda, Otacílio Brito, à assessoria de imprensa do Instituto Mamirauá.

Ariranha nada tranquilamente por Amanã. Foto: André Coelho.
Ariranha nada tranquilamente por Amanã. Foto: André Coelho.

Criada em 1998, a Reserva de Desenvolvimento Sustentável de Amanã é uma unidade de conservação estadual. Ela se estende por 2,35 milhões de hectares, entre o Rio Japurá, afluente do Solimões, e o Rio Unini, na Bacia do Rio Negro, em quatro municípios do Amazonas (Maraã, Codajás, Coari e Barcelos). Vizinha a RDS Mamirauá, onde são encontrados ambientes inundados, abriga paisagens diferentes, com predomínio de florestas de terra firme.

A principal atividade econômica na reserva é a produção de farinha, mas o gado tem um papel importante no sustento das famílias. “A produção de farinha tem limitações porque você precisa que a planta cresça, depois fazer a colheita, depois todo o trabalho de torrar a farinha, vender”, diz Paula Araújo. “O gado tem uma alta liquidez. Se você tem alguma necessidade de converter aquilo em moeda, em valor monetário, você consegue vender um animal e pegar uns mil e quinhentos a três mil reais, dependem o tamanho do animal”.

Fundo Amazônia

O BioREC é um projeto de cinco anos, que começou a ser implantado pelo Instituto Mamirauá no final de 2013, portanto segue até o ano que vem. Ele prevê investimentos de R$ 8,5 milhões para desenvolver ou melhorar técnicas de aproveitamento econômico da floresta com menos impactos ambientais, principalmente o desmatamento.

O biólogo Paulo Roberto Souza, responsável técnico pelo BioREC, lembra que na região, que inclui as Reservas de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá e Amanã, o desmatamento está bem distante dos níveis registrados no Sul do Pará, por exemplo, mas as atividades de manejo e agropecuárias tradicionais, com a derrubada e queima da floresta significam, em níveis bem inferiores, a emissão de gases de efeito estufa.

“O que se quer é melhorar essa prática tradicional, com base no conhecimento científico gerado ou que já havia sido gerado anteriormente, melhorando as unidades de conservação e utilizando a floresta de uma forma menos impactante”, explica o biólogo.

A diversificação da produção é um dos caminhos apontados para reduzir o desmatamento. Paulo Roberto Souza cita como exemplo a instalação de uma casa de polpas na comunidade Boa Esperança, em Amanã, que utiliza energia solar para mover as máquinas e conservar as polpas.

A produção de polpa pode ter um efeito indireto sobre a floresta, reduzindo a pressão para a abertura de áreas para roças de mandioca. Frutos como açaí, cupuaçu, cacau ou araçá, que podem ser transformados em polpa, são encontrados na floresta ou em plantios feitos pelos ribeirinhos em áreas degradadas.

 

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Comentários 1

  1. George diz:

    1. Se ensinarem como aumentar a produtividade e lucratividade do gado, a área ocupada por gado vai aumentar, não diminuir, porque ficou mais rentável. Isso é teoria econômica básica.

    2. Se dividirem os R$ 8,5 milhões pelos 58 produtores dá R$ 146 mil por produtor, ou R$ 11.565 por cabeça de gado na reserva. Seria muito mais eficiente comprar todos os bois e pagar os caras para deixar de criar gado. Daria para gerar uma renda de pelo menos R$ 7.300 por produtor por ano, em perpetuidade.