Reportagens

Festança no parque

Crianças curtem colocar a mão na terra, correr, fazer coisas novas. Os aniversários mais divertidos podem ser comemorados em parques, sem nenhum presente de grego para a natureza.

Adriana Maximiliano ·
25 de julho de 2007 · 17 anos atrás

Quando minha filha, Barbara, nasceu, há dois anos, os pais brasileiros já estavam há tempos na onda de comemorar aniversários com superproduções Hollywoodianas em casas de festas. Mesas decoradas com personagens da Disney, música alta, aluguel de brinquedos, animadores que conhecem o aniversariante na hora da festa e, no fim, lixo, muito lixo. Nos Estados Unidos, muitas famílias seguem o mesmo ritual de pagar um preço alto por uma festa impessoal e dispendiosa para o meio ambiente. Mas no bairro onde eu moro, em Washington, é diferente.

Fora o meu vizinho mais famoso e menos querido, George W. Bush, os pais que optaram por criar seus filhos aqui parecem preocupados com o futuro do planeta. Não importa a profissão – jornalistas, advogados, músicos, sociólogos etc. – eles seguem um estilo de vida parecido: não têm carro, detestam o consumismo exagerado dos shoppings dos subúrbios americanos, fazem compras em feiras locais e supermercados de comida natural, adoram roupas de algodão orgânico, brinquedos de materiais naturais e são fãs de todo tipo de reciclagem.

Nos últimos dois anos, fomos a apenas um aniversário em casa de festa. E aquele ficou na lembrança como o mais frio de todos. Os demais aconteceram em parques, nos quintais ou até mesmo dentro de um quarto-e-sala aconchegante, com talheres dos donos da casa, brinquedos do dia-a-dia do aniversariante, música de adulto e decoração minimalista. Para a comemoração dos 2 anos da minha filha, eu decidi manter a simplicidade da comunidade, mas fazer uma festa assumidamente “verde”.

Com um pouco de paciência e a ajuda de sites especializados – como o Green Guide da National Geographic -, e do livro “Simply Green – Parties”, foi fácil. Mas, nos sites e revistas de língua portuguesa, não encontrei nada sobre o assunto. Uma versão brasileira dessa festa vai exigir um pouco mais de persistência e criatividade para encontrar os melhores produtos. Eis aqui o passo a passo:

1- Local da festa – Minha lista de convidados tinha cerca de 20 crianças e 40 adultos da vizinhança. Decidimos, então, fazer a festa no Mitchell Park, um pequeno parque de fácil acesso no nosso bairro, com mesas para piquenique, muitas árvores e brinquedos tradicionais, como escorrega e balanço.

Parques públicos, fazendinhas ou até mesmo uma praia no fim de tarde são outras boas alternativas. Se chover, o melhor é adiar a festa para a semana seguinte. Trocar o parque pelo playground do prédio na última hora tiraria toda a graça de uma festa verde.

2- Convite – Poupar o papel e enviar convites on-line é o meio mais ecologicamente correto. Alguns sites, como o americano e-vite, enviam os convites, pedem confirmação de presença, ajudam os donos da festa a calcular os gastos, dão idéia de jogos e até enviam um cartão (também on-line) de agradecimento para os convidados depois da festa, o que é praxe por aqui.

Como crianças de 2 anos ainda não têm o hábito de conferir e-mails, mas adoram receber convites em mãos, escolhi um segundo caminho: convites de papel reciclado feitos em casa. Criei os convites no computador, usei folhas de um bloco de papel reciclado e fiz os envelopes com outros papéis coloridos de folhetos recebidos pelo correio ou mesmo na rua.

Para quem quiser criar um convite mais atraente, basta prender o papel com uma fita em um saquinho de celofane com bolinhas de chocolate orgânico ou jujuba.

3- Cardápio – Simplificar é o melhor negócio se você não pretende contratar garçons, passar a festa olhando o forno ou jogar comida no lixo. Como nossa festa estava marcada para às 17h, o cardápio foi leve: frutas da estação, mini sanduíches frios, castanhas, queijos, sorvete de casquinha e um bolo de chocolate orgânico. O pecado ficou por conta de uma tradição de que não quis abrir mão: o brigadeiro, mas tentei melhorar nos ingredientes, usando chocolate orgânico. Para beber, sucos de fruta, vinho e água.

Quem quiser incrementar o bolo, pode fazer algo inspirado no tema verde, como um imenso planeta Terra, uma árvore, bichos etc.

Quanto às velas do bolo, procure as feitas de pura cera de abelha, que têm aroma perfumado. As comuns, feitas de parafina ou outras substâncias derivadas do petróleo, não vão deixar saudade.

4- Pratos, copos, talheres e afins – É possível fazer uma festa com tema da Disney ou similar sem agredir muito o meio ambiente. Há alguns sites que vendem produtos para festa temáticos e biodegradáveis ou recicláveis. Como preferi seguir o tema “festa verde”, procurei testar as novidades neste campo. A exceção foi a toalha de mesa, que levei de casa, já que apenas uma mesa grande do parque seria suficiente.

Entre os consumidores que mais prezam o meio ambiente, a moda é usar produtos de bambu. Bandejas, potes e cestas coloridas estão à venda nas melhores lojas dos Estados Unidos. Há também pratos e talheres descartáveis de bambu orgânico em vários tamanhos e modelos. Comprei pratos pequenos e sporks (colheres-garfos) para a hora do bolo. Segundo o fabricante, além de o bambu crescer mais rapidamente do que outras árvores, os produtos descartáveis derivados dele demoram apenas de quatro a seis meses para se decompor.

Outra opção é a cana-de-açúcar. Encontrei no supermercado local cumbucas descartáveis de bagaço de cana-de-açúcar não alvejado para colocar as frutas. Na embalagem, uma boa notícia: “No trees” (sem desmatamento). Há também pratos, bandejas, copos e talheres do mesmo material.

Os produtos da cana não são bonitos como os de bambu, mas podem ser pintados por fora pelas próprias crianças alguns dias antes da festa. Assim, elas têm uma chance de se envolver nos preparativos da festa e, ao ver o resultado na mesa, ficarão orgulhosas.

5- Decoração – Os balões de gás estão em baixa. Mesmo os de látex biodegradável podem provocar danos à vida silvestre e nenhuma criança ficaria feliz de saber que um animal engoliu um pedaço de balão estourado e morreu. Uma boa alternativa é o balão de papel biodegradável, também chamado de balão japonês. Eles são vendidos em formato de animais e fazem sucesso com as crianças. Além de serem, sozinhos, uma excelente opção de decoração, podem ser distribuídos para os convidados levarem para casa depois do bolo. Mais alegria e menos lixo.

No Reino Unido, existe também o eco-paper balloon. Feito de papel japonês e revestido com álcool polivinil, ele se dissolve na água. Os mais populares, em forma de pombos, são inflados com gás helium e soltos em casamento.

Se quiser enfeitar mais, alguns vasos de flores frescas na mesa resolvem.

6- Lembrancinhas – Essa é a parte mais divertida. Sabe aquelas sacolinhas cheias de quinquilharias de plástico que vão para o lixo menos de 24 horas depois da festa? Esqueça. Faça o mesmo com as lembranças personalizadas. Por mais bonito que seja seu filho, nenhum convidado vai pendurar um relógio na parede com a foto dele por muito tempo. É melhor comprar apenas uma lembrança que a criança goste e brinque por meses.

No Brasil, encontrei um grilo pula-pula feito a mão de madeira e arame. Além de bonito, é diversão garantida. Ele é vendido por R$ 7 em shoppings da Zona Sul do Rio, mas também pode ser encontrado na internet por R$ 2,80 ou R$ 4 (modelo diferente). Para meninas mais velhas, preferi dar bolsinhas brancas com lápis de cera dentro para elas mesmas pintarem suas bolsas ou pulseiras de madeira e prendedores para os cabelos – encontrei alguns lindos na Mundo Verde. Também encontrei minilivros interessantes.

Uma boa idéia é explorar as lojas do Saara, no Rio, do bairro da Liberdade, em São Paulo, e nas feiras de artesanato em todo o Brasil em busca de brinquedos de materiais naturais.

Em sites do Reino Unido, encontrei os melhores brindes: uma bola de futebol fair trade, ou seja, comercializadas de maneira justa e ética; blocos de papel reciclado com mensagens na capa do tipo “Eu já fui uma caixa de suco”; sacolas e bolsinhas de 100% algodão feitas a mão; e pulseiras, quebra-cabeças, corda de pular e piões de madeira. Para crianças de 1 ano, sugiro palhacinhos de feltro ou pequenos instrumentos musicais de madeira, como chocalhos.

Para entregar com as lembranças, fiz pequenos bilhetes de papel reciclado no computador, agradecendo a presença dos convidados.

7 – Atividades – Nas festas dos parques, as crianças não vão poder dar voltas em brinquedos como num shopping ou pular na cama elástica da casa de festas. Mas é possível fazer atividades em grupo que vão ficar marcadas na lembrança: plantar uma árvore em homenagem ao aniversariante ou uma pequena planta para cada criança presente. Antes de começar, é preciso consultar a administração do parque para saber que tipo de árvore você pode plantar ali para não causar dano ao meio ambiente. E seria bom avisar aos pais para que as crianças apareçam com roupas adequadas para mexer na terra. Outra opção é plantar flores em pequenos vasinhos que os convidados podem levar para casa ou dar de presente para outras pessoas no parque.

No aniversário da Barbara, tivemos vasinhos com sementes de flores e também uma pequena máquina de bolhas de sabão. Para completar, levei bolas e outros brinquedos que temos em casa.

Outras opções: contratar um músico que entretenha as crianças com cantigas folclóricas ou pintar uma casinha para a aniversariante levar para casa depois da festa – há opções de casas de pano ou papelão no mercado.

8- Detalhes – Calcule quantas horas vai durar a festa para que ninguém fique às escuras no parque. Se tiver mosquistos, o dono da festa deve levar repelentes. Dê preferência para um parque ou praia que você conheça bem para não ter surpresas como acesso complicado, banheiros interditados, penetras etc. Lembre-se de levar todo o lixo da festa com você.

A festa da Barbara estava programada para durar duas horas, mas quatro horas depois das 17h ainda tínhamos convidados no parque. As crianças foram embora sujas de terra, cansadas e felizes. E os adultos também. Depois da festa, recebi e-mails dos convidados agradecendo. Uma mãe até me mandou uma foto do filho dormindo com o grilo brasileiro na mão. “Ele ama esse grilo e não larga nem na hora de dormir”, ela disse. Mas o melhor foi ver o parque limpo depois de tanta comemoração e ter a certeza de que a Mãe Natureza não pagou a conta.

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