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Pagamento pré-datado

Governo entregará ao Congresso novo projeto de lei para definir política de pagamento por serviços ambientais. Os obstáculos ainda são muitos e o dinheiro para a conservação, pouco.

Daniel Mello ·
17 de julho de 2008 · 16 anos atrás

O Congresso deve aprovar ainda este ano um projeto de lei para regulamentar o Pagamento por Serviços Ambientais (PSA). Pelo menos é nisso que acredita o secretario de Extrativismo e Desenvolvimento Rural do Ministério do Meio Ambiente(MMA), Egon Krakhecke.

Segundo ele, o ministério está trabalhando em um projeto de lei que irá estabelecer uma política nacional para o assunto. Pagamentos por serviços ambientais são mecanismos financeiros que valoram recursos naturais e os benefícios que proporcionam. A cobrança pelo uso da água por ser considerado um serviço ambiental, assim como o seqüestro de carbono por uma floresta.

Krakhecke explicou que o Ministério pretende criar o Programa Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais e trabalhar inicialmente com dois subprogramas. Um deles incorporaria o projeto Bolsa Verde do deputado Antônio Palocci (PT-SP). O objetivo é associar o incentivo de práticas sustentáveis à inclusão social, e para isso necessitaria de cerca de 50 milhões de reais para começar a funcionar.

O outro subprograma seria mais amplo, “sem recorte social”, e teria como foco a valorização da “floresta em pé”. Para esse último projeto seriam necessários aproximadamente 100 milhões de reais. “A política de pagamentos de serviços ambientais é um suporte forte para poder fazer a transição de um modelo insustentável para um modelo mais sustentável” ressalta o secretário.

No entanto, membros da sociedade civil ainda estão céticos quanto ao compromisso do Governo Federal, entre eles o gerente de Economia e Conservação da Conservação Internacional(CI), Alexandre Prado. “Esse projeto, que eu saiba, já está no executivo faz uns três anos”, lembra. Na avaliação de Prado somente iniciativas de parlamentares, como os projetos de lei propostos até agora, não são capazes de garantir o estabelecimento de uma política de PSA. Ele acredita que é preciso um engajamento do governo em favor da proposta.

O deputado Anselmo de Jesus (PT-RO), autor do principal projeto sobre PSA em tramitação, também avaliou que é difícil conseguir progresso no tema “se não tiver a presença do Ministério do Desenvolvimento Agrário, da Agricultura, do Meio Ambiente e da Casa Civil, que é quem define as políticas do governo”. O deputado disse que tem feito articulações com o Ministério do Meio Ambiente e acha que o apoio do ex-ministro da Fazenda, deputado Palocci traz mais respaldo político a proposta. “O Palocci é presidente da comissão que trata da reforma tributária, já é um espaço para que na própria reforma tributária nós possamos discutir isso”, concluiu.

O dinheiro

O deputado De Jesus considera que do mesmo modo como se destinam recursos bilionários para o financiamento do agronegócio e à agricultura familiar, “nós temos que começar a pensar também em orçamentos vultuosos para o PSA”. “Não adianta fazer um projeto sem estar disposto a fazer os investimentos”, bradou. Para ele, os recursos devem vir principalmente do Orçamento da União, mas que se deve ainda cobrar dos “países poluidores”.

Para Alexandre Prado, o recurso público é fundamental para financiar políticas como o pagamento por serviços ambientais , como no caso da Costa Rica, pioneira nesse tipo de política. “A Costa Rica pegou um empréstimo com o Banco Mundial para financiar o projeto. Eles não tinham o dinheiro e pegaram um empréstimo, para você ver o comprometimento do Executivo com o negócio”, ressaltou Prado. Na opinião dele, os investimentos públicos dariam, inclusive, mais credibilidade para que investidores privados também aportassem recursos. Dinheiro que poderia vir até do mercado de carbono.

Em exposição feita durante o Seminário sobre Pagamento por Serviços Ambientais, que aconteceu n Câmara dos Deputados, em Brasília, no dia 10 de julho, o diretor do Serviço Florestal Brasileiro, Tasso de Azevedo, explicou que o financiamento para o PSA poderia vir dos diretamente beneficiados pelos recursos naturais. Ele citou o agronegócio, dependente da preservação da água e do solo e o setor hidrelétrico, que depende da saúde dos mananciais e do ciclo de chuvas. Tasso apontou ainda o setor do petróleo, como forma de compensar os danos do combustível com o seqüestro de carbono. Após esses três pagarem uma parte da conta, argumentou Azevedo, o restante seria pago pelo Orçamento da União, ou seja, pago pela sociedade brasileira, outra beneficiária dos serviços ambientais. O diretor ainda creditou uma parte aos financiadores estrangeiros.

Proambiente

O Proambiente é o projeto que serve de modelo para o PSA no Brasil, “uma experiência trazida por agricultores familiares da Amazônia para o Ministério do Meio Ambiente”, como explicou a secretária de Políticas Sociais da Contag (Confederação dos Trabalhadores da Agricultura), Alessandra Lunas. O projeto acontece há cinco anos em nove pólos, um em cada estado da Amazônia Legal, atendendo cerca de 500 famílias por pólo.

Os agricultores do programa recebem informações de como produzir com o mínimo de agressões ao meio ambiente, como o não-uso de agrotóxicos ou fogo para limpar a terra. Eles recebem 300 reais. A preservação da reserva legal e adaptação às normas ambientais também são regras segundo Alessandra. E por evitarem queimadas, poluição dos rios com agrotóxicos e manter a reserva legal de pé, os agricultores, ela avalia, prestam serviços não só a eles mesmos, mas para a “humanidade” .

* Daniel Mello é repórter em Brasília.

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