Os lances foram apresentados em menos de dez minutos e o consórcio liderado pela estatal Chesf obteve o direito de realizar o empreendimento ao oferecer um preço máximo de 78 reais por megawatt hora (MW/h). Belo Monte terá capacidade instalada de aproximadamente 11,6 MW. Vai se tornar a terceira maior usina hidrelétrica do mundo, apenas atrás de Três Gargantas, na China, e Itaipu Binacional, entre Brasil e Paraguai.
Embora já houvesse informações que o leilão tinha sido bem sucedido, nem o nome do consórcio vencedor, ou preço oferecido por ele tinham sido divulgados. Isso porque uma nova liminar foi obtida graças a uma ação movida pela ONG Amigos da Terra – Amazônia Brasileira, que argumenta que nos documentos do leilão da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) o tamanho do reservatório é 30% maior do que aquele que foi aprovado no licenciamento do Ibama. A confusão só terminou por volta das 16h desta terça, quando a liminar que barrava a divulgação do resultado do leilão foi derrubada, novamente no TRF-1.
O consórcio vencedor foi o Norte Energia, composto pelas empresas Companhia Hidro Elétrica do São Francisco (CHESF), Construtora Queiroz Galvão S/A, Galvão Engenharia S/A, Mendes Junior Trading Engenharia S/A, Serveng-Civilsan S/A, J Malucelli Construtora de Obras S/A, Contern Construções e Comércio Ltda, Cetenco Engenharia S/A, e Gaia Energia e Participações. Quem saiu perdendo foi o consórcio Belo Monte Energia, formado por Andrade Gutierrez Participações S/A, Vale S/A, Neoenergia S/A, Companhia Brasileira de Alumínio, Furnas Centrais Elétricas S/A, e Eletrosul Centrais Elétricas S/A.
Revestida de problemas de viabilidade ambiental e econômica, a usina de Belo Monte contou com uma estratégia pesada do governo federal que garantiu financiamento de 80% da obra através do BNDES e desconto de 75% do Imposto de Renda da empresa ganhadora do leilão. Ainda assim, as duas maiores empreeiteras do país, Odebrecht e Camargo Corrêa, desistiram do leilão afirmando que não havia sustentação econômica para o projeto. O governo estipulou como limite máximo o preço de 83 reais por MW/h.
De última hora
A poucos minutos do meio dia, horário inicialmente marcado para o início do leilão, o TRF-1 cassou a liminar concedida nesta segunda-feira pela Justiça do Pará e que impedia o certame. Na madrugada desta terça-feira, manifestantes do Greenpeace despejaram toneladas de estrume na frente do prédio da Aneel. O estrume sustenta ainda cartazes amarelos onde se lê frases como “Belo Monte de… problemas” e “Belo Monte de … merda”.
A guerra de liminares na Justiça ainda envolveu um outro recurso, que deu a Aneel o direito de impedir que os manifestantes se aproximassem do prédio onde ocorreu o leilão. A decisão, contudo, não afugentou o Greenpeace, que manteve ativistas acorrentados às grades de entrada do prédio da agência.
Além do Greenpeace, o dia foi movimentado em Brasília com milhares de representantes de movimentos sociais chegando ao setor de autarquias, onde se encontra a sede da Aneel.
Irregularidades
Principais irregularidades do projeto de Belo Monte (fonte: MPF/PA)
1 – É a primeira vez que um empreendimento afeta diretamente terra indígena, aproveita recurso hídrico de terras indígenas e a Constituição exige, no artigo 176, que esse tipo de aproveitamento só poderá ser autorizado pelo poder público após edição de leis ordinárias regulamentando a questão, o que não existe no ordenamento jurídico brasileiro. 2 – A equipe de técnicos que fez o licenciamento consignou em um dos documentos públicos: “Não foi feita análise das contribuições das audiências públicas”. A Constituição Federal determina que o Brasil, enquanto estado democrático de direito, deve garantir a participação popular. E no caso de um licenciamento, essa participação não pode ser meramente formal. Fazer audiência pública e ignorar o que o público disse é contrário aos princípios democráticos. No caso específico de Belo Monte, ignorar a sociedade é ainda mais lamentável porque, pela primeira vez, cientistas de várias instituições se reuniram para analisar o projeto e contribuir com o licenciamento, mas não foram considerados devidamente. |
Esta foi a segunda vez que o leilão da hidrelétrica foi ameaçado por ações interpeladas pelo Ministério Público Federal. A interpretação dos promotores é de que o licenciamento ambiental desta que pode vir a ser a terceira maior barragem do planeta foi um processo marcado por uma série de irregularidades. Os principais argumentos são de que a obra afetará áreas indígenas, cujos habitantes não foram devidamente consultados.
O pedido da promotoria do Pará voltou também a lembrar que o Ibama transgrediu todas as leis do bom senso ao passar por cima de seus técnicos. Foram três pareceres totalmente contrários à emissão da licença de Belo Monte, mas mesmo assim a presidência do órgão optou por assinar a licença.
O Eco revelou no último dia 18 que o atual diretor de licenciamento do Ibama, Pedro Bignelli, chegou a omitir informações em entrevista à jornalista Miriam Leitão, afirmando que as ações do Ministério Público Federal baseiam-se em informações de pareceres antigos. No entanto, existem documentos emitidos a apenas dois dias da assinatura da licença que mostram a impossibilidade de licenciar o empreendimento. Saiba mais aqui.
O juiz Antonio Carlos Campelo, que decidiu pela concessão da liminar, chega a citar a incongruência no texto do ato desta segunda-feira. Na folha 26 da decisão, pergunta:
“COMO, NO MESMO DIA, DOIS DOCUMENTOS SÃO EMITIDOS, PELO IBAMA, COM INFORMAÇÃO TOTALMENTE CONTRADITÓRIA EM UM EMPREENDIMENTO DE GRANDE VULTO E COMPLEXIDADE COMO O AHE BELO MONTE?”
Veja a íntegra da decisão aqui
A Advocacia Geral da União, que havia na semana passada conseguido reverter a primeira decisão de suspender o leilão, avisou que iria recorrer quantas vezes fosse preciso para manter o leilão de pé. Agora, a previsão da Aneel é de que até o dia 28 de outubro sejam assinados os contratos de comercialização de energia.
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