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Acelere sem fumaça

Que tal sair por aí dirigindo um super esportivo não poluente, que acelera de zero a 100 km por hora em quatro segundos? Te deixa eletrizado? Você está certo.

28 de julho de 2006 · 18 anos atrás
  • Eduardo Pegurier

    Mestre em Economia, é professor da PUC-Rio e conselheiro de ((o))eco. Faz fé que podemos ser prósperos, justos e proteger a biodiversidade.

Todo mundo concorda que carros causam um monte de problemas. Poluição, trânsito, acidentes, exacerbam o individualismo, a lista é grande. O transporte deveria ser coletivo. Ponto pacífico. Mas tudo isso pros outros, porque, no fundo, nós (ou a maioria de nós) ambicionamos e adoramos os carros. Eles nos levam da porta de casa a do destino escolhido carregando a bagagem, tocando música e climatizando a viagem. Nos permitem a liberdade de ir e vir quando queremos. Menos edificante, aumentam a nossa sensação de potência. Quando o pé controla o acelerador, nossos corpos saem por aí a velocidades e distâncias impossíveis.

Centauros enlatados e hipócritas é o que somos. Os trens já eram. Mesmo na ambientalmente correta União Européia os subsídios passam dos 50% da receita total para manter a malha ferroviária operando. Nos EUA, o que sobrou dos trens é administrado por uma rara estatal, a deficitária AMTRAK. No Brasil, mesmo a tradicional linha de passageiros que existia entre Rio e São Paulo foi desativada.

Nada pára nossa voracidade por carros. Nem o barril do petróleo a caminho de US$80, nem as evidências científicas cada vez mais fortes da influência humana sobre o clima. A China, campeã de crescimento econômico, tinha 20 milhões de carros em 2004. A previsão é que esse número cresça sete vezes, até os 140 milhões em 2020. Comparando-se com padrões internacionais, a frota no país deverá se estabilizar em torno de 250 milhões de veículos. Para comparar, os americanos têm, hoje, uma frota de 130 milhões de veículos. O total mundial é de 600 milhões. Se a tendência recente de crescimento se manter, chegaremos a um bilhão de carros em 2020.

Cadê aqueles pitorescos trabalhadores da China comunista indo de bicicleta para o trabalho? Quem vai nos salvar de nós mesmos ou conciliar a nossa voracidade por quatro rodas com o desenvolvimento sustentável?

Os carros não vão nos deixar tão cedo. Precisamos é que eles melhorem. Existem várias tecnologias novas concorrendo para torná-los mais eficientes. Porém, mudanças drásticas de paradigma tecnológico costumam vir de nova concorrência e não de firmas já estabelecidas. É a chamada destruição criativa que pode acabar com a poluição dos carros movidos a motor a explosão.

Um grupo de empreendedores fundou no Vale do Silício a Tesla Motors. O aporte inicial de recursos veio de um dos fundadores da Pay-pal, Elon Musk. Os donos da Google, Sergey Brin e Larry Page, também já botaram dinheiro nela. Com 80 funcionários, a empresa acaba de lançar o seu primeiro modelo, um roadster literalmente elétrico, ou seja, não produz qualquer emissão de gases.

O carro tem dois lugares e visual de Ferrari. Acelera de zero a 100 km por hora em 4 segundos e tem autonomia de 400 km. O custo de rodagem é baixo. Pelo preço (nos EUA) de um litro de gasolina, percorrerá 63 km. Mas o brinquedo é caro, cada unidade sairá entre $85 e $100 mil dólares. Mas como os seus criadores dizem, celulares, geladeiras ou tevês começaram como produtos de rico. Aos poucos, o aumento do volume de produção baixou os preços até se tornarem produtos largamente consumidos.

O coração do Tesla Roadster é um conjunto de 400 kg formado por baterias de íon-lítio, semelhantes às dos laptops, e recarregáveis em três hora e meia. Isso representa um grande avanço em relação à primeira geração de carros elétricos, como o modelo EV-1 da General Motors. Existem teorias conspiratórias e até um filme “Who killed the eletric car?” dizendo que esse último foi retirado do mercado por conta dos interesses da indústria automobilística. Mas parece que a verdadeira razão foi o seu baixo desempenho e dificuldades de manutenção (pesquise o assunto no blog do David Friedman). O EV-1 tinha autonomia de menos de 150 km sem uso de ar-condicionado ou faróis. Seus conjunto de baterias de chumbo-ácido pesava 100 quilos a mais que o modelo da Tesla e continha um terço da energia.

Como toda boa companhia do Vale do Silício, a Tesla Motors já deu cria mesmo antes de começar as vendas. Um de seus primeiros funcionários, Ian Wright saiu para fundar a Wrightspeed. A empresa ainda não tem um modelo comercial, mas apresentou um protótipo com as tecnologias que pretende oferecer, o X1. Em um desafio contra Ferraris e Porshes, ele venceu fácil na arrancada e completou a primeira milha na frente. Vale a pena ver o vídeo, disponível no site da empresa.

Na década de 80, os novos bárbaros Steve Jobs, Bill Gates, Michael Dell e outros, ao abraçarem o conceito dos computadores pessoais, usurparam a liderança da indústria da informática de uma empresa considerada invencível, a IBM. Hoje, ela é só mais uma e deve dar graças a Deus de ter conseguido se reestruturar e sobreviver. Não existe nada menos poluente que a indústria de informática. Os PCs são construídos com recursos minimalistas e consomem pouca energia. Consomem software e produzem informação, que não pesa nem cheira. Cruza fronteiras, não de caminhão ou container, mas por satélites ou estreitas fibras óticas, também feitas de areia.

Parece que a indústria da informática cansou de esperar pelo progresso da indústria automobilística. Será que chegou a sua vez, General Motors?

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