Se há no mundo um arco do triunfo consagrado à crise financeira, ele se chama Empire State Building. O edifício cravou as primeiras estacas de seus 103 andares numa terra que Wall Street acabara de arrasar em 1929. Ficou pronto em pouco mais de um ano. E ligou suas luzes em 1931 como um manifesto em concreto e estilo art déco do que a economia americana seria capaz de fazer com a Grande Depressão.
Ele foi o prédio mais alto do mundo por quase um quarto de século. Em 2001, não era mais sequer o maior de Nova York, quando caíram as torres do World Trade Center e o Empire State passou a acumular o título de monumento histórico com seu novo recorde de verticalização em Manhattan.
Do Zeppelin à internet
Quase octogenário, está solidamente passado sobre os anacronismos que acumlou com o passar do tempo. Inaugurado num momento em que a aviação decolava rumo à era do jato, conserva no topo, como observatório, a estação de desembarque feita para os passageiros do Zepellin. Precedeu a televisão e hoje tem sua própria página na internet, vendendo ingressos para os elevadores. Foi campo de batalha – pelo menos na versão cenográfica de sua cumeeira, espetada por antena de rádio – para o combate definitivo da civilização contra a natureza bruta, na filmagem original de King-Kong. Mas, atualmente, sua administração avisa ao público, on-line, sempre que desliga a iluminação noturna para dar passagem aos bandos de aves migratórias, que são atraídas fatalmente por suas lâmpadas, ao transitar pela rota novaiorquina.
Produto da quebradeira de 1929, o Empire State está aproveitando o clima da crise econômica de 2009 para uma recauchutagem geral mais radical que a da ministra Dilma Roussef. Entrou no ano passado numa reforma de que sairá na forma ideal para mostrar ao mundo, do alto de seus 449 metros, que os arranha-céus não precisam consumir, como consomem, 70% da eletricidade de Nova York.
Em outras palavras (as da moda) é candidato a modelo de “sustentabilidade”. Na época em que foi construído, o termo nem existia, pelo menos em sua acepção ambiental. Se siginificasse alguma coisa, certamente seria na época alguma coisa a respeito da solidez estrutural de suas traves de aço ou outras virtudes estritamente imobiliárias. Agora, não.
Oitentão sustentável
O Empire State é concorre neste momento ao uso oficial do neologismo com um projeto de renovação orçado em 500 milhões de dólares. Da conta, 20 milhões de dólares são especificamente para evitar desperdícios, o que exige, entre outros retoques, a instalação de vidros triplos e forros isolantes em suas 6.500 janelas, de interruptores automáticos em todos os cômodos e de climatização informatizada. A partir do ano que vem, cada ocupante do prédio saberá, instantaneamente, via internet, quanto seus hábitos estarão qualquer momento queimando em eletricidade ou gerando em CO2.
Tudo isso promete cortar em quase 40% seus gastos de energia e reduzir sua conta de eletricidade em mais de 4 milhões de dólares por ano. Em troca, como essas providências, ele servirá de vitrine para “educar” governos, imobiliárias e construtores “ao redor do mundo” na arte de ganhar dinheiro com indultos no impacto ambiental.
Não é de hoje que o Empire State serve de palanque para campanhas de mudança na sociedade americana. No alto do prédio brilhou, em 1932, o farol que anunciou a Nova Jersey a vitória do democrata Franklin Roosevelt nas eleições presidenciais. Em 1956, instalaram-se lá em cima os holofotes que sinalizavam, aos recém-chegados a Nova York, a recepção na “terra da liberdade”. Sem falar que suas luzes, na morte de Frank Sinatra, ficaram azuis como os olhos do cantor. E verdes quando voltaram aos Estados Unidos as tropas que acabavam de render o Iraque com a Tempestade no Deserto capitaneada pelo governo do George Bush pai.
Entrando na briga contra o aquecimento global, o Empire State se torna um instrumento de propaganda ainda mais eloqüente. Se ele, como seu tamanho e sua idade, pode servir de exemplo, qualquer prédio também pode. “Acho que estamos provando que é possível diminuir significativamente as emissões de gases do efeito estufa de um jeito que é muito, muito rentável”, diz Clay Nesler, da Global Energy and Sustainability, uma das firmas que assinam a reforma.
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