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Mudança do clima não muda os costumes

Se nem a evidência de que a barragem do Algodão 1 estava rachando sobre 800 famílias serviu de aviso aos piauienses, o que se pode esperar das notícias sobre o aquecimento global?

3 de junho de 2009 · 15 anos atrás
  • Marcos Sá Corrêa

    Jornalista e fotógrafo. Formou-se em História e escreve na revista Piauí e no jornal O Estado de S. Paulo. Foi editor de Veja...

A notícia de que 800 famílias piauienses aguardaram o desastre em suas casas, sob a barragem de Algodão 1, não deixa de ser um aviso para quem acha que pode mobilizar a opinião pública, falando de aquecimento global. Se nem ali, com a água derretendo concretamente a represa, a cautela conseguiu mudar hábitos consagrados pelo cotidiano, antes que fosse tarde demais, não dá para querer que o mundo se antecipe ao debate de cientistas sobre um certeza cheia de dúvidas, como a desordem climática.

Está para sair do forno nos Estados Unidos uma pesquisa mostrando que o maior problema do aquecimento global talvez seja o fato de se chamar, nos jornais, “aquecimento global”, associado pelos discursos políticos a sacrifícios imediatos para compensações futuras. Em janeiro, logo depois da posse do presidente Barack Obama, que pôs o assunto na ordem do dia, uma enquete do Pew Research Center mostrou que, dos 20 problemas vistos pelos americanos como prioridades governamentais inadiáveis, o desastre climático era o vigésimo. No último lugar da fila, poderia esperar indefinidamente pela solução do desemprego ou do terrorismo.

Furacões e secas

Não é de hoje que o homem vive em terras férteis de encostas vulcânicas ou criou sociedades prósperas em territórios imemorialmente varridos por terremotos. Mas só agora o Centro de Pesquisas em Decisões Ambientais da Universidade de Colúmbia, em Nova York, procura as fontes psicológicas dessa vocação coletiva para a imprudência.

Semanas atrás, o repórter Jon Gertner, que escreve sobre economia e meio ambiente no jornal New York Times, assistiu a uma rodada desses testes. O laboratório fica num porão da universidade, sem janelas para fora. A sala é monitorado por câmeras e microfones. Lastreia-se num fundo de 6 milhões de dólares, da National Science Foundation, para decifrar de onde vêm “nossas respostas à mudança climática e outros fenômenos, como furacões e secas”.

No caso, Gertner presenciou um debate sobre como aplicar uma verba hipotética de 5 bilhões de dólares em energia eólica. Ao grupo, formado majoritariamente por alunos de Colúmbia, que podiam não entender patavina de energia eólica, competia optar se era melhor construir turbinas já ou investir parte do dinheiro federal no desenvolvimento de geradores mais eficientes para o futuro.

A decisão, em si, era o que menos interessava aos pesquisadores, concentrados nas reações das cobaias diante de opções difíceis como as ambientais, que envolvem perdas e ganhos, tempo e incerteza. Mas dessas experiências saíram resultados práticos, como a prova de que basta formar times no laboratório, distribuindo por exemplo uma estrela azul entre alguns participantes, para que seu pendor para a cooperação cresça automaticamente de 35% para 50%. E pode chegar a 70%, se a equipe se reunir em torno de uma mesa.

Em resumo, os grupos atuam melhor em confraria, hesitam em relação a definir preferências, porque em princípio preferem tudo, são analíticos a longo prazo e emocionais nas emergências. Pode estar longe o dia em que isso tenha algum efeito sobre o aquecimento global. Mas, pelo menos, é uma saída para o fracasso dos ambientalistas em explicar que a coisa é séria.

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