Análises

Licenciamento ambiental e sua importância para a proteção do meio ambiente e da sociedade

Uma análise sobre o recente caso da praia do Pepê na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro

Antonio Marcos Barreto ·
20 de abril de 2023 · 1 anos atrás

Tem chamado muita a atenção dos cariocas, de políticos, especialistas e de organizações da sociedade civil (ONGs), a solicitação feita à Justiça pelo Ministério Público Federal (MPF) no dia 03 de abril para a paralisação imediata das obras que a Associação Carioca de Windsurf (ACW) está realizando na faixa de areia da praia do Pepê, na cidade do Rio de Janeiro (RJ). 

De acordo com o MPF, foi emitida uma licença da obra que autorizava apenas a construção de um depósito de equipamentos no subsolo do calçadão da orla e, de forma alguma, teria sido autorizada a ocupação da faixa de areia, considerada como área de preservação permanente (APP) pelo Código Florestal brasileiro. Sendo que este tipo de intervenção deveria ter sido licenciada por uma autoridade ambiental, prevendo seus possíveis impactos ambientais negativos e impondo as medidas de controle ambientais necessárias para a sua mitigação e para a compensação dos impactos irreversíveis.

Neste sentido, o Licenciamento Ambiental passa a ser considerado a última fronteira de proteção ao meio ambiente e à sociedade, sendo este um dos mais importantes instrumentos da Política Nacional de Meio Ambiente brasileira estabelecida pela Lei Federal 6.938 de 1981. Esta lei determina que qualquer construção, instalação, ampliação ou funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadores de recursos ambientais, efetiva ou potencialmente poluidores ou capazes, sob qualquer forma de causar degradação ambiental, dependerão de prévio licenciamento ambiental. 

O licenciamento ambiental é um procedimento administrativo, no qual as autoridades ambientais Federal, Estaduais e Municipais concedem dentro de suas competências, e com seu poder de polícia administrativa, uma autorização para a execução de atividades e operações que de alguma forma utilizam ou interferem nos recursos ambientais. Este procedimento, que é de suma importância, passa a depender de estudos ambientais prévios, elaborados por equipe técnica multidisciplinar, e cujo resultados irão subsidiar os analistas dos órgãos ambientais para o estabelecimento das medidas de controle de poluição e degradação ambiental. 

Desta forma, há de se considerar que até que se prove o contrário o uso e a ocupação do prisma praial ou da areia da praia, com o possível impedimento da regeneração das espécies de restinga e fixadoras de dunas e com o impacto direto sobre a paisagem e a fauna nativa, deve ser considerada uma atividade potencialmente poluidora e degradadora, e, portanto, dependente de prévio licenciamento ambiental – e não somente de uma licença de obras. 

Além disso, devem ser consideradas as inúmeras falhas ou interferências que podem ocorrer nos chamados “auto licenciamentos”, quando quem propõe as intervenções causadoras de impactos ambientais é o próprio Poder Executivo e, por isso, os órgãos ambientais licenciadores podem se sentir pressionados ou ameaçados para que a licença seja expedida com maior brevidade que o necessário para que se tenha uma análise técnica rigorosa e, principalmente, para a devida publicidade, transparência e integração destes processos com a sociedade, como prevê a legislação. 

Daí, a grande importância que tem a formação e a participação dos Conselhos de Meio Ambiente nos processos de Auto Licenciamento. Principalmente para aqueles que são considerados de grande impacto ambiental local ou regional. O que tem despertado a atenção no município do Rio de Janeiro nos últimos anos é que esta não é a única obra que vem sendo questionada pela sociedade e pelo judiciário, muito pelo contrário. O município do Rio vem sofrendo constantemente, com inúmeras manifestações do Ministério Público Estadual e Federal e da sociedade civil organizada, em diversas obras e empreendimentos.

Neste contexto, precisamos destacar que uma das principais ações da Prefeitura do Rio foi tirar a atribuição do licenciamento ambiental municipal da Secretaria Municipal de Meio Ambiente da Cidade – SMAC, e passar para a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico, Inovação e Simplificação – SMDEIS. Esta mudança na estrutura do Licenciamento Ambiental municipal do Rio, não faz sentido algum, uma vez que o órgão ambiental municipal ficou completamente desprestigiado e enfraquecido, sendo que historicamente, a SMAC foi considerada como umas das Secretarias municipais de meio ambiente mais completa e competente para o licenciamento ambiental, quando em comparação com as demais Secretarias de grandes capitais do País.

É preciso ter muita atenção neste caso, uma vez que não se pode confundir a simplificação ou agilidade no licenciamento ambiental, com a ausência ou fragilização deste procedimento, e do órgão ambiental licenciador. Muito pelo contrário, um órgão ambiental fortalecido e prestigiado, com gestores competentes e equipe técnica especializada e capacitada, é que deve ser o antídoto contra a insegurança jurídica ambiental que vem se estabelecendo no município e no estado do Rio, e que tem via de regra, desestimulado inúmeros empreendedores e investidores a colocarem seu dinheiro em novos negócios, devido ao alto risco para seus investimentos. Temos que avançar muito na simplificação e padronização de procedimentos, esta é uma crítica comum, e que inclusive vem sendo tratada no Congresso Nacional e nas Legislações Ambientais de todo o País, como é o caso do próprio SELCA Sistema Estadual de Licenciamento Ambiental e demais Procedimentos de Controle Ambiental, criado pelo Decreto 46.890 de 2019 no estado do Rio de Janeiro, e que vem sendo adotado como referência para inúmeras legislações municipais.

Porém, o que se entende por simplificação é a criação de novas rotinas e processos, apoiados em novas tecnologias e com base na inovação técnica e científica, mas de forma alguma, se confunde com o uso de artifícios ou a ausência de procedimentos, que negligenciam a importância da proteção e da preservação ambiental. Temos a certeza que toda e qualquer atividade potencialmente ou efetivamente poluidora pode requerer o seu Licenciamento Ambiental, como é o caso da obra da Associação Carioca de Windsurf (ACW). Nem sempre todas as atividades terão seu licenciamento deferido, mas na grande maioria, quando assim for permitida a concessão da licença ambiental, esta será sempre uma garantia de menor impacto ambiental e de maior confiança da sociedade, uma vez que toda licença ambiental tem consigo, as medidas de controle ambiental definidas como condicionantes ou condição de validade, com base nos limites máximos de poluição ou degradação ambiental impostos pela legislação brasileira.

Nesta critica, não se está colocando a sociedade contra o crescimento e desenvolvimento econômico, e muito menos acusando ninguém e nenhum empreendimento, o que se está cobrando, é o fortalecimento dos órgãos ambientais licenciadores, em especial os municipais, como no caso a SMAC, pois estes são os órgãos que atuam diretamente sobre o controle da poluição e do impacto ambiental local. Precisamos que todos entendam que para alcançar os objetivos do desenvolvimento sustentável (ODS), e para ter a garantia de uma Gestão ambiental pública de qualidade, que o instrumento do licenciamento ambiental não seja enfraquecido ou negligenciado. E para que este procedimento possa ser ágil e simplificado é obrigatório manter uma equipe técnica competente e prestigiada, e a imposição das medidas de controle ambientais cabíveis e pertinentes, para a garantia de um meio ambiente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial a qualidade de vida, conforme determina o artigo 225 da nossa Constituição Federal brasileira. Estamos vigilantes e convencidos de que dias melhores virão. O ambiente, o desenvolvimento e a sociedade agradecem!

As opiniões e informações publicadas nas seções de colunas e análises são de responsabilidade de seus autores e não necessariamente representam a opinião do site ((o))eco. Buscamos nestes espaços garantir um debate diverso e frutífero sobre conservação ambiental.

  • Antonio Marcos Barreto

    Vice-presidente Nacional da ANAMMA (Associação Nacional de Órgãos Municipais de Meio Ambiente)

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