Há pouco tempo comentei já ter praticado Mountain Bike, antes de me dedicar ao montanhismo, durante os meus onze e doze anos. Na verdade, eu achava que praticava, pois ao longo de uma pesquisa sobre a evolução dos equipamentos para a prática desse esporte, descobri que eu o realizava da forma mais tosca e rudimentar possível. Tinha apenas uma bicicleta com 21 marchas e uma garrafa de água acoplada a ela. A princípio pensei: “naquela época não tinham tantos equipamentos disponíveis como atualmente”. Parte dessa afirmação é verdade, pois, apesar dos equipamentos já existirem, a maioria era importada e contava com as restrições das poucas lojas que comercializavam e os altos valores associados ao investimento. Entretanto, os equipamentos estão aí já há algum tempo e a tecnologia para a melhoria do desempenho dos atletas está muita avançada. Se eu tivesse acesso a essas informações na época, teria me divertido muito.
Voltemos um pouco para o século XV e XVI. Mais uma vez o inventivo pioneiro de protótipos foi Leonardo da Vinci, que projetou um modelo arrojado de velocípede que já contava com pedais, manivelas e engrenagens nas rodas dianteiras. Parece óbvio isso, mas mesmo com os diversos modelos que sucederam este projeto, a primeira bicicleta a contar com esses aparatos surgiu três séculos depois. Aliás, estudando sobre as idéias propostas há séculos atrás, percebi que dificilmente algo que seja inventado hoje não tenha sido pelo menos imaginado até o século XVIII. Como exemplo, os quadros de alumínio, os pedais clipless (aqueles que deixam os pés presos ao pedal) e as suspensões dianteira e traseira.
O primeiro modelo concreto (vide construído) foi a Kassler, exposta no Deutsches Museum de Mônaco. Trinta anos depois, em 1791, surgiu o Celerífero, que não possuía pedais, manivelas, nem sistema de direção. Parecia mais com um skate alto de duas rodas, pois para movimentá-lo o indivíduo deveria usar os pés no chão, como alavanca. Imaginem o quão cansativo deveria ser isso em uma trilha. Um pequeno avanço ocorreu em 1817, com a criação de uma bicicleta com sistema de direção (ainda sem pedais). Foi tão inovadora, que logo surgiu uma corrida de Draisinas (nome dado ao modelo), cujo vencedor completou os dez quilômetros do percurso em 31 minutos e trinta segundos. Esse foi o marco para o ingresso das bicicletas no mundo dos esportes.
As coisas começaram a mudar mesmo em 1865, com a “Boneshaker” (isso mesmo, “chacoalhador de ossos”). Apesar do desconforto, ela possuía os pedais, direção e engrenagens na roda dianteira. O esquisito mesmo era o seu visual. A roda dianteira era substancialmente maior do que a traseira, e o selim ficava no alto. Uma queda era realmente muito dolorida. Apesar de esquisito, esse modelo ganhou estabilidade e viabilizou um incremento de velocidade. Em 1880, surgiu o modelo com corrente, tornando-se o básico para a prática do esporte. A partir daí, teve início a corrida pelo desenvolvimento de modelos específicos para cada atividade ligada ao ciclismo e dos equipamentos que poderiam ser acoplados à bicicleta, de acordo com o objetivo do atleta e do ideal de desempenho.
A Itália trouxe uma inovação para os adeptos do ciclismo outdoor, no ano de 1915: A primeira bicicleta para terrenos acidentados, a mountain bike, com sistema duplo de suspensão. Mas o desenvolvimento de tecnologias para a evolução do esporte foi alavancada a partir do final dos anos 60 e início dos 70. Até então, as bicicletas ainda possuíam um quadro arredondado e, apesar de já contarem com alguns apetrechos, ainda possuíam o design e aerodinâmica de bicicletas de passeio. Os modelos subseqüentes de bicicletas para mountain bike foram aos poucos se especializando nos cinco seguintes tipos de modalidades. As cross-country, pouco confortáveis, porém robustas o suficiente para subir uma montanha, atravessando todo o tipo de terreno, desde sua base. As enduro (ou all mountain), versão bike das corridas de regularidade, que aliam as características de leveza das cross-country e os pontos fortes das bicicletas para downhill. As freeride, mais pesadas, com foco em resistência para cruzar grandes distâncias. As downhill, também mais pesadas e com suspensão mais sensível, desenvolvidas para resistir a corridas em velocidade por terrenos muito íngremes, sinuosos e acidentados. E por último as trilhas, muitas vezes classificadas como a tradicional mountain bike, desenvolvidas especificamente para trilhas mais leves e que não requerem muita preocupação com suspensão.
Creio que o primeiro equipamento específico para praticantes de ciclismo, e que não fazia parte da bicicleta em si, foi o “Velodog”, uma arma específica para espantar os cães que atacavam as bicicletas no modelo “Boneshaker”. Por serem muito altas, as tradicionais abordagens caninas causavam acidentes sérios (apesar de não ser um equipamento de desempenho, não resisti em compartilhar essa informação). Curiosidades a parte, teve início a busca pela leveza e funcionalidade, com o máximo de qualidade em resistência. A primeira bicicleta de alumínio (mais leve que suas antecessoras, de aço) surgiu em 1890, na França. Pouco depois, passaram a ser registradas patentes de tecnologia de marchas (a primeira com três, atualmente o mercado oferece modelos com 27) e sistemas de câmbio e manetes mais precisos. E ainda nem chegamos no século XX.
Com o tempo, grandes revoluções ocorreram nos freios, que foram do ferro ao plástico (com pouquíssima resistência) e depois para as atuais ligas de alumínio, com partes de plástico (agora com excelente resistência mecânica). Ficaram cada vez mais funcionais e com mais qualidade. Os mais atuais possuem até display mostrando a marcha em que se está. Em pouco menos de quinze anos, as bicicletas para trilhas, cross e downhill evoluíram de freios que precisavam ser acionados ao máximo para funcionarem mal (chamados popularmente de ferradura), para freios que ocasionavam um impacto brusco, resultando em um “vôo” do ciclista por cima da bicicleta, caso ele não estivesse bem regulado ou se não soubesse utilizá-lo bem. Hoje já existem os freios a disco, mais sensíveis e inteligentes, que reduzem a velocidade gradual e suavemente.
O interessante na evolução desses equipamentos é que, no fundo, não ocorre nenhuma grande inovação funcional. O desafio continua sendo o incremento de desempenho e qualidade naqueles que já existem, diversificando e reconfigurando o conjunto bicicleta – equipamentos para cada modalidade específica. Tudo depende do objetivo e de quanto o atleta pretende gastar. Até que, para os meus doze anos, eu não estava tão mal.
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