A votação de medidas para conter as emissões do transporte marítimo global foi adiada por ao menos um ano, após uma reunião encerrada na última semana pela IMO (sigla em Inglês da Organização Marítima Internacional) – agência das Nações Unidas que regula o setor.
A decisão foi baseada num pedido da Arábia Saudita apoiado por Estados Unidos, Rússia e outros grandes produtores e consumidores de petróleo. “O adiamento mostra a força dos países petroleiros e enfraquece a IMO”, avaliou Mariana Andrade, coordenadora de Campanhas de Oceano no Greenpeace Brasil.
Especialmente os Estados Unidos pressionaram nações vulneráveis a tarifas e aliados estratégicos para minar o apoio que o acordo já tinha. A ofensiva inverteu uma aprovação parcial de abril, por 63 países, incluindo Brasil, China e Índia. A organização tem 176 estados-membros.
O governo Lula manteve um apoio com ressalvas à iniciativa: defende metas de descarbonização, mas rejeita uma taxação de carbono que possa penalizar exportadores de commodities agrícolas e minerais. “Isso reflete as contradições da política climática brasileira”, apontou Andrade.
“O Brasil tem se mostrado climaticamente ambicioso em fóruns internacionais, mas internamente toma decisões que vão no sentido oposto, como a abertura da nova frente de exploração de petróleo na foz do Amazonas”, disse. “Isso mina sua credibilidade às vésperas da COP30”.
Com o adiamento, empresas e portos devem rever planos para renovar frotas e adotar combustíveis alternativos, bem como buscar regras para reduzir riscos à competitividade, já que o acordo pode, num primeiro momento, aumentar os custos operacionais do setor.

Não por acaso, a prorrogação frustrou ambientalistas e países – sobretudo europeus – que defendiam a implantação imediata de uma taxa sobre os combustíveis fósseis marítimos. Para eles, isso é fundamental para que o setor neutralize suas emissões até 2050.
Mas o “pacote climático” empurrado para o ano que vem tinha mais propostas, como limites progressivos para cortar emissões, incentivos a combustíveis menos poluidores e um fundo para apoiar tecnologias de baixo carbono nos países em desenvolvimento.
Queimando principalmente óleos pesados que emitem gases de efeito estufa, outros poluentes e fuligem, o transporte marítimo responde por cerca de 3% das emissões globais de CO₂, volume semelhante ao da Alemanha. Também há vazamentos de metano e gases refrigerantes.
Contudo, a estimativa é conservadora, ressaltou Andrade. “O setor faz parte da cadeia do petróleo. Se considerarmos toda a extração, transporte, refino e uso do combustível, o impacto real é muito maior”.
Apesar das disputas políticas e dos custos, a crise climática exige ações rápidas e concretas de todos os setores, mesmo os de menor participação na soma das emissões. Cada atraso amplia o desafio e torna mais caro e difícil conter o aquecimento global.
Responsável por apoiar tecnicamente, aplicar e fiscalizar no Brasil as normas da Organização Marítima Internacional, a Marinha não atendeu aos nossos pedidos de entrevista até o fechamento da reportagem.
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