Notícias

Agência vê pico de emissões até 2025, mas 1,5ºC ainda fora de alcance

Salto de 40% em renováveis desde 2020 mexe pouco no predomínio dos fósseis na matriz energética global; mundo segue no rumo de 2,4ºC de aquecimento

Leila Salim · Priscila Pacheco · Claudio Angelo ·
26 de outubro de 2023 · 1 anos atrás
Acordo de Paris
Notícias sobre os acordos climáticos de Paris.

A Agência Internacional de Energia (IEA, na sigla em inglês) publicou nesta terça-feira (24) seu aguardado relatório anual World Energy Outlook. O documento mostra que os investimentos em energia renovável aumentaram 40% desde 2020. No entanto, esse crescimento não será suficiente para conter a crise climática se a demanda por combustíveis fósseis não diminuir rapidamente. 

Segundo a IEA, a participação dos combustíveis fósseis no fornecimento global de energia, que está estabilizada há décadas em cerca de 80%, diminui para 73% até 2030, sendo que as emissões globais de dióxido de carbono relacionadas à energia devem atingir o pico até 2025. O relatório aponta que, sem mudanças aceleradas no setor de fósseis, as emissões globais de poluentes vão permanecer altas o suficiente para aumentar as temperaturas médias globais em cerca de 2,4 °C neste século. O limite do Acordo de Paris é 1,5°C.

“A transição para a energia limpa está acontecendo em todo o mundo e é imparável. Não é uma questão de ‘se’, é apenas uma questão de ‘quando’ – e quanto mais cedo, melhor para todos nós”, disse Fatih Birol, diretor-executivo da IEA.

O documento ainda lembra que o mercado de combustíveis fósseis é instável por causa de conflitos, como a guerra entre Ucrânia e Rússia e os embates prolongados no Oriente Médio. “Levando em conta as tensões e a volatilidade contínuas nos mercados de energia tradicionais de hoje, as alegações de que o petróleo e o gás representam escolhas seguras para o futuro energético e climático do mundo parecem mais fracas do que nunca”, afirmou Birol.

A IEA propôs um plano de cinco pontos para manter viva a meta de 1,5°C e garantir o sucesso da COP28, a conferência do clima que começa daqui a um mês e uma semana em Dubai. Segundo o World Energy Outlook, será preciso:

  1. triplicar a capacidade global de energias renováveis; 
  2. dobrar a taxa de melhorias na eficiência energética; 
  3. reduzir em 75% as emissões de metano das operações de combustíveis fósseis;
  4. adotar mecanismos inovadores de financiamento em larga escala para triplicar os investimentos em energia limpa em economias emergentes e em desenvolvimento; 
  5. e medidas para garantir um declínio ordenado no uso de combustíveis fósseis, incluindo o fim da aprovação de novas usinas termelétricas a carvão sem captura de carbono.

O aumento em três vezes da capacidade instalada de renováveis vem sendo defendido por ONGs ambientalistas, que querem que a COP produza uma decisão para atingir 1,5 terawatt em solar, eólica e outras fontes até 2030. Só que os ambientalistas também demandam uma eliminação gradual dos combustíveis fósseis. A IEA já havia dito, no mês passado, que nenhum projeto novo de fósseis poderia ser autorizado em nenhum lugar do mundo se a humanidade quisesse ter alguma chance de cumprir o objetivo de Paris. O novo relatório não repete o alerta, mas mostra como as políticas energéticas que os países já estão adotando mexeu os ponteiros e deslocou os fósseis pela primeira vez.

Até 2030, diz a agência, haverá quase dez vezes mais carros elétricos no mundo; painéis solares fotovoltaicos vão gerar mais eletricidade do que todo o sistema de energia dos EUA gera atualmente; a participação das energias renováveis na geração mundial de eletricidade se aproximará de 50%, contra 30% atualmente; bombas de calor e outros sistemas de aquecimento elétrico vão superar os boilers a óleo combustível e gás em todo o mundo; e haverá três vezes mais investimento em novos projetos de energia eólica offshore do que em novas usinas a carvão e gás.

Mas a dependência humana de combustíveis fósseis é tão imensa que, mesmo com essa revolução energética, a fatia de óleo, gás e carvão mineral na matriz global recua apenas sete pontos percentuais. O pico de emissões em 2025 é uma boa notícia, decerto, mas a física é implacável: para termos uma chance razoável de estabilizar o aquecimento global em 1,5ºC, é preciso cortar as emissões em 43% até 2030. Por enquanto isso não está no horizonte. 

  • Leila Salim

    Jornalista e doutora em Comunicação e Cultura pela ECO/UFRJ. Repórter com experiência em fact-checking, políticas públicas e direitos humanos.

  • Priscila Pacheco

    Jornalista independente apaixonada por viagens, cultura e meio ambiente.

  • Claudio Angelo

    Jornalista, coordenador de Comunicação do Observatório do Clima e autor de "A Espiral da Morte – como a humanidade alterou a ...

Leia também

Notícias
19 de outubro de 2023

Contexto atual do setor elétrico coloca em risco planos de descarbonização do Brasil

Uso de termoelétricas aumentou 200% nos últimos 20 anos, mostra estudo do Instituto de Energia e Meio Ambiente divulgado nesta quinta-feira (18)

Notícias
26 de setembro de 2023

Investimento em renováveis precisa ser 2,5 vezes maior para zerar emissões até 2030

Novo relatório da Agência Internacional de Energia diz que meta de aquecimento global em 1,5ºC está saindo do alcance, apesar de renováveis a manterem viva

Reportagens
12 de setembro de 2023

Zerar subsídio a fósseis é urgente para atingir metas de Paris, diz relatório da ONU

Primeiro balanço global do combate à crise climática destaca a desproporção entre investimentos em ação climática e na indústria de óleo, gás e carvão

Mais de ((o))eco

Deixe uma resposta

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.