Rio de Janeiro — O Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) divulgou, nesta quarta (06), relatório com análise de 90 metas globais e constatou que apenas 4 apresentaram progresso: fim da produção e uso de substâncias que destroem a camada de ozônio, eliminação do chumbo nos combustíveis, acesso crescente a fontes de água e mais pesquisas para reduzir a poluição no mar.
Entre os destaques negativos do relatório, pouco se avançou no enfrentamento das causas das mudanças climáticas ou na proteção da biodiversidade. A civilização humana está próxima de superar os limites planetários. Esta foi principal mensagem deixada pela quinta edição do relatório Panorama Ambiental Global (Global Environmental Outlook, GEO-5).
Mantido o ritmo atual, as emissões de gases de efeito estufa podem dobrar nos próximos 50 anos, aumentando a temperatura global em 3ºC ou mais até o final do século. O relatório revela que o período de 2000 a 2009 foi o mais quente já registrado e que, em 2010, o mundo emitiu as mais altas taxas de gases provenientes da queima de combustíveis fósseis e da produção de cimento.
O estudo adverte que, caso a temperatura mundial aumente para 2,5ºC, os prejuízos econômicos em consequência do aumento da temperatura são estimados entre 1 e 2% do PIB mundial todos os anos até 2100. Só em impactos e desastres provocados pelas mudanças do clima, o custo de adaptação de zonas costeiras, que sofrem ações diretas do aumento do nível dos mares e de tempestades, é estimado entre US$ 26 e US$ 89 bilhões até 2040.
O diretor Executivo do PNUMA, Achim Steiner, reforçou que a mudança do clima é hoje o maior desafio que a humanidade enfrenta, pois ainda não se encontrou nenhum mecanismo político viável para conter o problema. “O futuro das mudanças climáticas, da segurança alimentar, da pesca nos oceanos, da agricultura e do transporte público são escolhas que vão determinar o desenvolvimento sustentável de nossa sociedade. Hoje não temos uma solução nas arenas políticas”, argumentou.
Biodiversidade ameaçada
O mundo não conseguiu alcançar a meta dos Objetivos do Milênio de reduzir significativamente a taxa de perda de biodiversidade até 2010. Cerca de 20% das espécies de vertebrados estão ameaçadas. Os corais são os organismos vivos mais ameaçados de iminente extinção. Desde a década de 80, os recifes sofreram uma redução de 38% e as projeções para 2050 apontam para o seu fim.
“A erosão da biodiversidade é um processo que vem ocorrendo há séculos e estamos perdendo espécies diariamente a taxas alarmantes e as mudanças climáticas podem acelerar e muito essa perda”, avalia o secretário de Políticas e Programas de Pesquisa e Desenvolvimento do Ministério da Ciência e Tecnologia do Brasil, Carlos Nobre, que integrou o painel de mais de 300 cientistas que elaboraram o relatório.
Poluição do ar e mortes prematuras
Poucos avanços foram constatados no que se refere à diminuição da poluição do ar que é uma das principais causas de mortes prematuras. Por ano, 2 milhões de pessoas morrem precocemente em razão dos altos índices de poluição, dos quais 900 mil são óbitos de crianças menores de cinco anos.
O ozônio troposférico, que fica nas camadas mais baixas da atmosfera, mata cerca de 700 mil pessoas por problemas respiratórios, a sua maioria na Ásia (75%). Embora benéfico na estratosfera em que o ozônio forma uma camada protetora contra efeitos da radiação ultravioleta, o gás tem efeitos tóxicos aos seres vivos.
Na agricultura, os prejuízos econômicos planetários pela poluição do ar também são expressivos, entre US$ 14 e 26 bilhões por ano.
Escassez de água
O acesso à água aumentou, mas a sua qualidade e disponibilidade insuficiente continuam a ser as maiores causas de problemas de saúde. Enquanto as mudanças climáticas avançam e o a população mundial cresce, a pressão por acesso aos recursos hídricos é segue na mesma direção. Mais de 600 milhões de pessoas não terão acesso à água potável até 2015, enquanto mais de 2,5 bilhões não terão acesso a saneamento básico.
Até 2030, US$ 11 bilhões terão que ser gastos todos os anos para garantir o abastecimento de volumes suficientes de água, especialmente nos países em desenvolvimento.
Visão realista
Segundo Nobre, o relatório reúne conhecimento científico para embasar e apoiar a formulação de políticas públicas e traduz ao mesmo tempo o “censo de urgência” e expectativa que ronda a Rio+20. “O futuro não está esperando por nós. Tenho uma avaliação realista, não diria pessimista. É a partir da realidade do estado do planeta que temos que tomar as decisões”.
Nobre critica a inércia política vivida nos últimos 20 anos no plano internacional. “A Rio+20 é um momento em que a reflexão não é só dos indicadores ambientais, é um momento de mostrar que não se consegue separar a agenda ambiental da inclusão social e do desenvolvimento econômico”, afirmou.
Só no Brasil, mais da metade do PIB nacional depende de recursos naturais. Há preocupação que a floresta amazônica não resista a um aquecimento acima de 4ºC, pois nesse caso se tornaria uma savana. Hoje, a temperatura da Amazônia já subiu 1ºC. A floresta também pode padecer se o seu desmatamento superar 40% da sua área. “Não há nenhum limite que não possa ser revertido, mas estamos muito próximos de encontrar a irreversibilidade, por isso a ação é urgente”, concluiu Nobre.
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