Reportagens

Desmatamento em queda, governo em festa

Menos de um mês após divulgação de dados provisórios sobre derrubadas na Amazônia, ministros se reúnem mais uma vez em Brasília para comemorar.

Karina Miotto ·
10 de agosto de 2010 · 14 anos atrás
Da esquerda para direita: Ministro de Ciência, Sérgio Resende, Ministra de Meio Ambiente, Izabella Teixeira, e diretor-geral do INPE, Gilberto Câmara, durante divulgação dos números do Deter na última segunda (dia 09) (foto: divulgação MMA)
Da esquerda para direita: Ministro de Ciência, Sérgio Resende, Ministra de Meio Ambiente, Izabella Teixeira, e diretor-geral do INPE, Gilberto Câmara, durante divulgação dos números do Deter na última segunda (dia 09) (foto: divulgação MMA)
 

Cerca de 20 dias depois de afirmar que este ano o desmatamento da Amazônia será “o menor dos menores” devido à queda de 47% entre agosto de 2009 e maio deste ano, a ministra do meio ambiente Izabella Teixeira novamente reuniu a imprensa ontem, em Brasília, para comemorar a queda do desmate desta vez em 49% entre agosto de 2009 e junho de 2010.

Em 11 meses, o sistema detectou 1.808,55 km2 de áreas desmatadas. Ambas “comemorações” foram baseadas em dados do Deter, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Ainda de acordo com o sistema, 243,74 km2 da floresta amazônica sofreram corte raso ou degradação progressiva em junho. O estado que mais desmatou durante o mês foi Pará (160,63 km2), seguido de Mato Grosso (36,5 km2) e Amazonas (24,36 km2), que ultimamente vem se destacando entre levantamentos mensais de desmatamentos.

No entanto, é preciso ter cautela com dados do Deter – ele só registra derrubadas maiores do que 25 hectares e estas têm se tornado cada vez mais raras na região amazônica. Áreas menores do que isso correspondem a pelo menos 60% do desmate na floresta. “O resultado é muito bom. Foi como no ano passado: divulgamos mensalmente a tendência de queda com o Deter e, no fim do ano, o Prodes deu a menor taxa de desmatamento dos últimos 20 anos”, afirmou a ministra.

De acordo com Gilberto Câmara, diretor do instituto, em reportagem publicada pela Agência Brasil, “o Inpe não está afirmando que o desmatamento vai cair 50%. Além do problema da cobertura de nuvens, existe o dos pequenos desmatamentos”. “Olha que irônico: a ministra fala em queda do desmatamento baseando-se em dados do Deter, sistema do Inpe que, por sua vez, deixa bem claro que estes números não são qualificados para medir desmatamento”, afirma Marcio Astrini, da campanha da Amazônia do Greenpeace. “A atitude da ministra está mais para torcida do que para comemoração”, diz.

Logo, mais uma vez é preciso ter cautela ao afirmar queda do desmate com base apenas em dados do Deter. Apesar da tendência, a certeza definitiva do quanto o desmatamento vai ou não cair somente virá depois da divulgação dos dados do Projeto de Monitoramento do Desflorestamento na Amazônia Legal (Prodes), outro sistema do Inpe que calcula a taxa anual consolidada.

Com o objetivo de ampliar a fiscalização e o monitoramento da floresta, Gilberto Câmara anunciou a operação de dois novos satélites: o Cbers-3 em 2011 e o Amazônia-1 em 2012. Ambos vão melhorar a capacidade de observação tanto do Deter quanto do Prodes.

Para entender melhor a diferença entre os sistemas Prodes e Deter e também as recentes “comemorações” da ministra, leia a matéria Desmatamento na Amazônia: o menor dos menores? 

Tendência de queda

Apesar da aparente tendência de queda, o pesquisador Beto Veríssimo, do Imazon, acredita que o desmatamento vai, na verdade, aumentar. “Creio que o desmatamento vai terminar o ano ligeiramente maior do que em 2009. Nossos números indicam para o mesmo período um ligeiro aumento de 8%”.

De acordo com ele, isso não é preocupante. “Nada mal, considerando que muitos previam uma subida expressiva em função dos três fatores que têm contribuído para isso: economia forte, eleições e ano seco”. Ou seja, “o desmatamento não explodiu. Pelo menos não ainda”.

Veríssimo não acredita que a queda de 49% estimada pelo governo venha a se confirmar.”A tendência é um ligeiro aumento e não uma queda estrondosa”, diz. Já Marcio Astrini prefere não fazer nenhuma previsão. “Os números do Inpe indicam tendência de queda. Por sua vez, os do Imazon apontam para a direção oposta. Existe uma contradição”.

Enquanto os números oficiais do Prodes não forem divulgados, será que a ministra fará mais coletivas de imprensa do tipo em Brasília para falar sobre queda histórica do desmatamento na Amazônia? Vale lembrar que, apesar de “comemorações” do tipo já terem sido feitas em governos anteriores, 2010 trata-se de ano eleitoral. “Talvez ela queira se sentar ao lado do Lula e receber um abraço”, diz Marcio. (Karina Miotto)

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