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Joga no lixo, parte I

Como aproveitar o potencial energético do lixo jogado fora na nossa própria casa e, ao mesmo tempo, contribuir para poupar os recursos naturais e gerar energia elétrica?

28 de agosto de 2007 · 17 anos atrás

Cada brasileiro produz, em média, 1kg de lixo por dia. Só em 2000, a quantidade de resíduos sólidos urbanos coletados diariamente em todo o Brasil foi de 228 mil toneladas. No lixo domiciliar há restos de alimentos, papel, papelão, plásticos, vidros, metais, tecidos, borrachas, pedras e madeira, entre outros materiais. Ou seja, está na hora de falarmos aqui da transformação dos resíduos sólidos urbanos em energia elétrica.

Vamos avaliar até que ponto o aproveitamento dessa alternativa, encontrada no nossa própria lata de lixo, pode contribuir para a matriz elétrica brasileira, atualmente composta por 80% de energia renovável. Apenas a título de comparação, a oferta de energia elétrica mundial é atendida prioritariamente por energia térmica, sendo cerca de 82% de fontes não-renováveis e apenas 18% de renováveis.

Como, então, aproveitar esse material, já descartado, para produzir energia elétrica?

Tecnologias energéticas

Existem diversas tecnologias de aproveitamento do lixo sólido urbano para geração de energia elétrica. Dentre elas podemos citar, como alternativas viáveis para o Brasil, a incineração controlada, a queima do biogás e a gaseificação.

Os materiais combustíveis, como lixo orgânico, papel, papelão, madeira, plástico, borracha e tecido, apresentam uma solução bastante simples, podendo ser queimados para gerar energia elétrica.

A prática de incineração é muito adequada para instalação em áreas de grande geração de resíduos, contribuindo para reduzir o volume dos resíduos destinados aos aterros, e gerando sais minerais decorrentes da decantação das cinzas que podem ser aproveitados como corretivo de solos ou para fabricação de tijolos.

A incineração de 215 mil toneladas de lixo coletado, diariamente, em todo país, que são destinadas aos lixões e aos aterros, poderia produzir cerca de 2 mil GWh/mês, podendo atender a 11 milhões de residências com consumo médio de 200 MWh/mês.

Apesar disso, a incineração ainda causa bastante polêmica. A queima desses materiais libera subprodutos tóxicos e cancerígenos, como metais pesados, cloros, dioxinas e furanos, de onde surge a necessidade dessa queima ser controlada com a instalação de filtros e equipamentos adequados, obedecendo, às normas ambientais. Além disso, as cinzas provenientes do processo de incineração e as águas ácidas da lavagem dos gases também devem ser tratadas.

Outra tecnologia com grande potencial de geração de energia elétrica é a queima do biogás (ou gás de lixo), proveniente da decomposição anaeróbica dos resíduos orgânicos nos aterros, em motores de combustão interna a gás.

Essa queima contribui para reduzir as emissões de gases de efeito estufa – composto aproximadamente por 50% de metano, gás com poder de aquecimento global maior que do dióxido de carbono -, o nível de ozônio e os poluentes tóxicos ao destruir os compostos orgânicos voláteis.

Considerando que a quantidade diária de lixo coletado no Brasil que é encaminhada para os aterros sanitários e que é composta de materiais orgânicos biodegradáveis é de cerca de 57 mil toneladas, o potencial de geração de energia elétrica proveniente do gás do lixo poderia ser em torno de 10 mil GWh por ano, suficiente para atender a cerca de 40 milhões de habitantes, representando 2% da oferta de energia elétrica.

Já a tecnologia de gaseificação da biomassa presente no lixo consiste na queima dos materiais combustíveis, ricos em carbono, junto com oxigênio e vapor d’água, para produzir gás de síntese. Essa mistura combustível de gases, depois de limpa (retirada das partículas sólidas) e resfriada, alimenta a câmara de combustão de uma turbina a gás, gerando energia elétrica.

Essa tecnologia também contribui para reduzir o volume de lixo destinado aos aterros e não emite gás poluente. No entanto, ela possui elevado custo de operação e manutenção e menor eficiência energética quando comparada com as fontes convencionais, dado o elaborado sistema de resfriamento dos gases e a necessidade da freqüente manutenção do sistema de limpeza.

Aplicando essa tecnologia às mesmas 57 mil toneladas de lixo coletados por dia no Brasil, o potencial de geração de energia elétrica oriundo desse sistema seria de aproximadamente de 7 mil GWh por ano, capaz de suprir energia elétrica para 28 milhões de habitantes.

Há ainda uma lista de tecnologias que poderiam suprir ao menos uma pequena parte da crescente demanda de energia elétrica do país aproveitando o nosso próprio lixo. Além disso, essas tecnologias ainda contribuem para diminuir o volume de lixo depositado nos aterros (aumentando o seu tempo de operação), minimizar o impacto ambiental da disposição final dos resíduos, entre outras vantagens.

No entanto, o que falta para incentivar os investimentos nessas tecnologias, é, principalmente, reduzir seus elevados custos e mostrar para os potenciais investidores os seus benefícios ambientais e sociais de longo prazo.

A próxima coluna tratará de outros métodos e tecnologias de aproveitamento energético dos resíduos sólidos urbanos, principalmente reciclagem.

*Se alguém tiver interesse em se aprofundar nesse assunto, estudos mais detalhados podem ser encontrados nas teses de mestrado de Rachel Martins Henriques (2004) e de doutorado de Luciano Basto Oliveira (2004), do Programa de Planejamento Energético da COPPE/UFRJ (www.ppe.ufrj.br).

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