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BC aperta no crédito a desmatadores

Resolução proíbe bancos de emprestar a produtores com cadastro ambiental sobreposto a terras públicas ou suspenso

Observatório do Clima ·
30 de junho de 2023

DO OC – O Banco Central publicou nesta quinta-feira (29) uma resolução que amplia as restrições de crédito rural a desmatadores em todos os biomas do país.

nova norma altera o Manual do Crédito Rural, que regulamenta as condições para empréstimos ao agro, de forma a fechar uma série de brechas que permitem hoje que dinheiro público do Plano Safra seja concedido para destruir ecossistemas nativos e aquecer o planeta.

Construída em conjunto pelos ministérios da Fazenda, do Meio Ambiente e da Agricultura, a resolução do BC proíbe que bancos emprestem dinheiro para propriedades que não estejam inscritas no Cadastro Ambiental Rural; que tenham qualquer parcela de seu CAR sobreposto a terras públicas, como florestas não destinadas, terras indígenas e unidades de conservação; e que esteja em listas de embargo do Ibama ou dos órgãos ambientais estaduais.

Trata-se de uma versão revista e ampliada de uma outra resolução, de 2008, que pela primeira vez limitou crédito rural a infratores ambientais no Brasil. Na época, a limitação de empréstimos bancários a empreendimentos embargados na Amazônia foi o maior instrumento do Ministério do Meio Ambiente para reduzir o desmatamento – a ela se reputa a queda na devastação vista entre 2009 e 2012, quando a área desmatada na floresta foi a menor da história

A resolução do BC de 2008, somada a um decreto de Lula de dezembro de 2007 estabelecendo os embargos de área desmatada e a um outro decreto de 2008 determinando o cumprimento do Código Florestal, foi o combo que levou a bancada ruralista à revolta e acabou produzindo a flexibilização da lei ambiental, em 2012.

O novo instrumento amplia a restrição a todo o país, não apenas à Amazônia, e tampa as brechas do anterior. “O manual de crédito anterior vedava empreendimentos e unidades de conservação. Mas se o fazendeiro ia ao banco e dizia que a plantação estava fora da área protegida, conseguia crédito mesmo que outras partes da propriedade estivessem sobrepostas”, disse o economista André Sant’Anna, assessor especial do Ministério do Meio Ambiente.

Outra mudança é que agora, para efeito de crédito, valem embargos estaduais e federais. Antes só podiam ter corte de crédito as áreas embargadas pelo governo federal, via Ibama. Isso acabou produzindo uma corrida dos Estados ao embargo de áreas, para se antecipar ao Ibama e permitir que as propriedades pudessem acessar recursos mesmo embargadas.

Por fim, e não sem ironia, o governo Lula usou um instrumento criado pela ministra de Jair Bolsonaro Tereza Cristina (DEM-MS) para apertar o cerco aos criminosos ambientais. A hoje senadora inventou a figura do “CAR suspenso” para proprietários que recebessem um determinado número de notificações por infração ambiental e não se manifestassem. Só que o CAR suspenso não implicava em nenhuma punição – até agora.

Os critérios para terras indígenas são mais frouxos: fica vedado o crédito sobreposto a áreas homologadas e “reservadas”, que constem no banco de dados da Funai. A resolução não trata de terras identificadas – segundo o OC apurou, o próprio Banco Central vedou estender a proibição para essas terras por temor de questionamentos judiciais do agronegócio que pusessem em risco toda a norma.

O secretário extraordinário de Controle do Desmatamento, André Lima, diz que a resolução do BC se enquadra na proposta de um Plano Safra cada vez mais voltado à agricultura de baixa emissão de carbono. Os R$ 364 bilhões de créditos anunciados por Lula já têm descontos em taxas de juros para a minoria (1%) dos produtores que têm o CAR validado (ou seja, já submetido à checagem dos governos estaduais para identificar as áreas de floresta e verificar a validade das informações declaradas pelo fazendeiro no ato da inscrição) no país; a intenção é escalar as facilidades de empréstimo e reduzir os juros para quem está em conformidade com a lei.

“Vamos direcionando no incentivo ao agronegócio e apertando o ogronegócio”, diz Lima.

  • Observatório do Clima

    O Observatório do Clima é uma coalizão de organizações da sociedade civil brasileira criada para discutir mudanças climáticas

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