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Foi dada a largada

Petrobras lança programa de patrocínio e oferece a convidativa cifra de até R$ 3,6 milhões por projeto sócio-ambiental de organizações de terceiro setor.

Andreia Fanzeres ·
28 de abril de 2006 · 18 anos atrás

Atenção organizações de terceiro setor sedentas por recursos – e não são poucos – para financiar projetos de meio ambiente: a Petrobras acaba de lançar mais um edital do Programa Petrobras Ambiental e colocou à disposição uma bolada de R$ 48 milhões a serem gastos em até dois anos com iniciativas que tratem de questões relativas à água.

É a segunda vez que a empresa oferece recursos desse porte. Em 2004, foram R$ 40 milhões que contemplaram 30 projetos espalhados pelo país, entre 1681 inscritos. Nessa nova leva de recursos, a Petrobras decidiu repetir o tema “água”, cuja conservação é importante, sobretudo, para seus próprios negócios.

“É uma grande oportunidade”, diz Fátima Sonoda, gerente executiva da Fundação Ecotrópica, que pretende se candidatar ao patrocínio com um projeto de conservação no Pantanal. A oferta é tentadora. Em alguns casos, o teto que cada projeto pode solicitar chega a ser o dobro do que é proposto nos demais editais. O máximo, no caso da empresa, são R$ 3,6 milhões. “Pelo volume de recursos investidos, é muito dinheiro para pouco tempo, o que requer uma certa base e logística da instituição para absorvê-lo e aplicá-lo da melhor forma possível”, considera Laury Cullen Jr., do Instituto de Pesquisas Ecológicas (Ipê). Ele teve seu projeto entre os 30 aprovados no primeiro edital, em 2004, e acredita que o ideal seria que essa mesma quantia pudesse ser trabalhada em prazos maiores, de quatro ou cinco anos, para dar um tempo de consolidação dos projetos.

Mas, isso nem de longe tira a importância do investimento. “É um recurso excepcional, com o qual as instituições podem ousar e ampliar seu raio de ação”, diz Cullen. No caso do Ipê, eles conseguiram plantar 750 hectares de floresta e conectar o Parque Nacional do Morro do Diabo à Estação Ecológica Mico Leão Preto, no Pontal do Paranapanema (SP), seguindo o curso de um rio com margens muito degradadas. “Esse é um recurso que permite às instituições fazerem coisas em escala real, não mais experimental”, diz.

Ele só lamenta que não possa reinscrever esse projeto, para que ele concorra à continuidade dos investimentos – queixa compartilhada, aliás, com outras instituições que tiveram projetos aprovados em 2004, como o “Reflorestágua: reflorestando e protegendo as águas do Tapacurá”, da Sociedade Nordestina de Ecologia (SNE). O jeito vai ser escrever um outro projeto, baseado no que já foi desenvolvido nos dois anos anteriores.

Maíra Braga, gerente executiva do projeto, acredita que conseguiu passar pela peneira da Petrobras porque propunha uma abordagem sistêmica em relação à questão da água, sem falar no apelo de querer cuidar de um rio que abastece cerca de 1,5 milhões de pessoas na região metropolitana do Recife e hoje sofre com a poluição. “Oferecemos uma visão integrada entre água, floresta e mobilização de diversas camadas da sociedade, com o objetivo ainda de influenciar políticas públicas e fazer com que a comunidade dê andamento as propostas sem depender tanto do trabalho da nossa ong”, explica Maíra.

Linha sócio-ambiental

Ao que tudo indica, a Petrobras deve querer aprovar os trabalhos mais consistentes nessa linha sócio-ambiental. Não por acaso, figuram entre os mais importantes critérios de seleção os quesitos participação da comunidade e impactos sociais dos projetos, além de, é claro, estarem preferencialmente localizados nas áreas de influência da empresa. Segundo o edital, os projetos precisam estar voltados à promoção e à conscientização do uso racional dos recursos hídricos, manutenção e recuperação de paisagens visando o equilíbrio dos ciclos hidrológicos ou à conservação de ambientes marinhos ameaçados.

Apesar de terem sido relatados alguns problemas em relação ao repasse dos investimentos aos projetos, notadamente aos nordestinos, e dificuldades de contato entre a Petrobras e as instituições, de uma maneira geral o programa de patrocínio ambiental da empresa tem mais pontos positivos do que negativos. “Enquanto outros editais são mais restritivos em relação ao uso detalhado dos recursos, a Petrobras permite que façamos quase tudo, cobrindo inclusive gastos fundamentais para o funcionamento da instituição que executa o projeto”, conta Maíra Braga.

Além disso, as instituições acham mais fácil trabalhar quando os recursos não são atrelados diretamente ao governo. “O repasse do dinheiro em editais com recursos do Fundo Nacional do Meio Ambiente (FNMA) é sempre mais complicado, porque depende do orçamento da União. E, não raro, o envio de recursos corre o risco de ser interrompido”, pondera Fátima Sonoda, da Ecotrópica.

Outros patrocínios

Ninguém duvida da importância desse montante para organizações da sociedade civil, mesmo havendo outras fontes de patrocínios ambientais que disponibilizam quantias semelhantes. No entanto, por se tratar da maior empresa brasileira e uma das que mais tem passivos ambientais, há quem ainda ache que o investimento é proporcionalmente insuficiente perto dos impactos que a empresa provoca no ambiente.

Só a Fundação O Boticário de Proteção à Natureza oferece um programa de financiamento com cifras em torno de R$ 2 milhões, que já beneficiou mais de mil projetos, em 16 anos. É, portanto, a instituição mais regular e consistente de apoio a iniciativas de terceiros voltadas à conservação no Brasil. Isso sem falar nas demais investidas próprias, como formação de pessoas e incentivos à criação de unidades de conservação – trabalhos custeados, em boa parte, com 1% do faturamento da empresa O Boticário.

Além de patrocínios ambientais de outras organizações como WWF, Conservação Internacional, SOS Mata Atlântica, TNC, Funbio e alguns bancos, um dos editais mais conhecidos e esperados pelas ongs brasileiras é o PDA (Projetos Demonstrativos), uma parceria entre o Ministério do Meio Ambiente (MMA) com o KFW (Banco Alemão de Crédito para a Reconstrução). Ao longo de 10 anos, o PDA contemplou aproximadamente 200 projetos e, desde 2004, iniciou uma fase nova de investimentos com três frentes: Mata Atlântica, Amazônia e consolidação de projetos apoiados no passado. Para o PDA Mata Atlântica, foram oferecidos R$ 40 milhões de reais, dos quais ainda precisam ser gastos R$ 7,5 milhões, em mais uma seleção que acontecerá em meados deste ano. O Padeq (Projetos alternativos ao desmatamento e à queimada) disponibilizou R$ 15 milhões de reais e o PDA Consolidação, a mesma quantia.

Atualmente os PDAs atendem a 146 projetos, por dois ou três anos, com recursos de, no máximo, R$ 500 mil para cada. “Nós atendemos iniciativas de pequeno e médio porte. E a Petrobras contempla outro tipo de demanda, em quantidade menor, e mais dinheiro”, explica Maurício Muniz Barbosa, analista ambiental do MMA.

Outro diferencial é que, em vez de concentrar os recursos em um tema, o PDA apóia estudos relacionados à criação de unidades de conservação, plano de manejo, ecoturismo, estabelecimento de micro corredores ecológicos, recuperação florestal, trabalhos alternativos ao uso do fogo, implantação de sistemas agroflorestais, beneficiamento de produtos não madeireiros, etc.

Depois dessa segunda chamada para a última fase do PDA Mata Atlântica, não há ainda data prevista para a elaboração de novos editais. Então, quem não quiser perder tempo e aproveitar essa oportunidade da Petrobras tem até o dia 7 de junho para se inscrever gratuitamente pelo site da empresa, preenchendo fichas e enviando os documentos solicitados. O resultado da seleção sai no final do mês de setembro.

  • Andreia Fanzeres

    Jornalista de ((o))eco de 2005 a 2011. Coordena o Programa de Direitos Indígenas, Política Indigenista e Informação à Sociedade da OPAN.

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