Se tem um brinquedo que é comum a muitas crianças é o Lego, aquelas pecinhas coloridas que se encaixam umas nas outras formando o que a imaginação permitir, estimulando diversas habilidades, como raciocínio lógico, autonomia, criatividade e coordenação motora. O legal dessas pecinhas é que o seu uso tem se ressignificado para além da diversão em casa, e se expandido cada vez mais em ambiente escolar. No último ano, jovens de todo o mundo iniciaram um torneio de robótica da First Lego League, que incentiva crianças e jovens de 3 a 15 anos a pensar em soluções tecnológicas usando as pecinhas coloridas de encaixar para resolver problemas diversos, que desta vez é voltado ao mar.
A escolha do tema mostra como o oceano está cada vez mais imerso nas pautas da sociedade. Isso vai ao encontro da necessidade de que assuntos globais, que demandam soluções globais, sejam discutidos por diferentes atores, não só por especialistas, incluindo as novas gerações. Além disso, o oceano é antídoto para muitos problemas atuais, pois está envolvido direta ou indiretamente nas três principais crises que a humanidade enfrenta hoje: as mudanças climáticas, a perda de biodiversidade e a poluição. Nesse sentido, a solução para essas crises precisa convergir para a garantia da saúde do oceano se quisermos preservar a vida no planeta nos próximos anos.
O objetivo principal do torneio é o aprendizado prático, divertido e emocionante, para que os participantes ganhem experiência em resolução de problemas do mundo real, além de desenvolverem o pensamento crítico, codificação e habilidades de design. A sigla FIRST significa “For Inspiration and Recognition of Science and Technology”, ou seja para a inspiração e reconhecimento da ciência e tecnologia, o mesmo nome da ONG estadunidense fundada em 1989 com o intuito de incentivar o conhecimento de jovens sobre temáticas STEAM (Ciência, Tecnologia, Engenharia, Artes e Matemática, na tradução para o português).
No Brasil, a iniciativa existe desde 2004, na categoria Challenge (desafio), hoje operada pelo Serviço Social da Indústria (Sesi). A partir de 2018, expandiu para as categorias Discover e Explore, que incluem crianças de 3 a 6 anos, e de 6 a 10 anos, respectivamente.
Cada equipe realiza de 10 a 12 atividades propostas no Caderno de Engenharia ao longo da temporada e precisa construir um modelo de exploração da temporada construído com pecinhas da marca Lego, mas também utilizando tecnologias. O professor recebe um guia que orienta cada atividade e ao final, os alunos registram todas as evoluções ao longo da temporada e apresentam em um evento de celebração.
Na categoria Challenge, por meio de uma mentoria, os jovens trabalham tendo como base Valores Essenciais como trabalho em equipe, inclusão, impacto, diversão, descoberta e inovação. Na temporada de 2024/2025, os estudantes têm como desafio mergulhar em um problema enfrentado por pessoas que exploram os oceanos.
Estímulo à cultura oceânica
A competição da FLL desta temporada vem ao encontro das necessidades da Década do Oceano da Organização das Nações Unidas (ONU) que busca uma maior conexão da sociedade com o oceano, favorecendo a integração deste ambiente no ensino básico.
“Antes dessa temporada, o oceano era uma área curiosa, algo que eu conhecia, mas queria saber mais sobre. Eu tinha conhecimento de que essa parte do planeta é de extrema importância para a nossa sociedade, entretanto, não sabia os reais motivos para isso. Atualmente, consegui me apaixonar mais pelo oceano e suas profundezas, seus organismos e desafios”, diz Giovanna Rodrigues dos Santos, 14 anos, estudante do 9º do ensino fundamental da Escola Sesi de Hortolândia que participa do torneio de robótica.
Um dos maiores desafios desta temporada está relacionado a temática, que pode ser muito ampla! “É importante tentar fazer eles pensarem fora do senso comum sobre o oceano. Fazer uma imersão profunda, com diferentes especialistas em diferentes áreas de atuação que contemplam o oceano, para que eles possam ter um arcabouço para desenvolver uma solução interessante para o problema proposto pela temporada, para ter destaque e também impactar os juízes e a sociedade com as descobertas deles. E isso tudo envolve dedicação dos estudantes, parceria com familiares, integração de escolas e organizações”, diz Everaldo de Jesus Leal Filho, Orientador de Educação Digital e Técnico de Equipe de Robótica da Rede Serviço Social de Indústrias (Sesi).
Estudantes do Colégio Domus Sapiens de Jundiaí também estão dedicados ao desafio para melhorar a saúde do oceano por meio da robótica. Beatriz e Gabriel do 9º ano, além de Heloisa e Felipe do 7º ano pretendem desenvolver um protótipo de drone subaquático para coletar amostras, tirar fotos e filmar debaixo d’água. Eles acreditam que mais acessibilidade para enxergar o fundo do oceano pode reverter na conscientização de pessoas comuns que nunca viram o fundo do mar e, portanto, aumentar o esforço de preservação. Os jovens lembraram que o desafio envolve enfrentar o efeito da luz azul, única cor que é refletida, no fundo do mar.
O torneio de robótica da First exemplifica a construção de um legado da conexão das novas gerações com ciência e tecnologia, especialmente no Brasil, onde os jovens têm mostrado um grande envolvimento com a competição. Nessa temporada, 828 equipes competiram nos 22 torneios regionais oficiais em 16 estados, somando mais de 7.300 estudantes, segundo dados do Sesi – Departamento Nacional, operador do Torneio da FLL no Brasil e organizador do Festival Sesi de Educação (onde acontecem os torneios).

Na edição anterior da First, o Brasil levou o primeiro e segundo lugar na modalidade Challenge e mais sete prêmios técnicos em todas as categorias, na etapa internacional. O torneio deste ano já possui os vencedores de cada regional, que seguirão para a etapa nacional marcada para março, conforme calendário do evento. A competição ainda continua em abril, onde as equipes vão disputar o torneio mundial correspondente à última etapa, onde somente os jovens da modalidade challenge concorrem, e poderão levar grandes conquistas para o Brasil e para nossos mares.
Vitrine de iniciativas que promovem a cultura oceânica
Para além do Torneio Sesi de Robótica, a inclusão da temática oceânica no âmbito educacional tem sido, felizmente, impulsionada no Brasil nos últimos anos. Graças a chegada da Década do Oceano em 2020, o oceano passou a ganhar um reconhecimento sem precedentes. Isso se deve principalmente por causa do décimo e último desafio estipulado pela Década que almeja incentivar a valorização da relação entre sociedade e oceano. Para isso, busca restaurar e fortalecer relações positivas do oceano em diferentes culturas e territórios.
No Brasil, o projeto Maré de Ciência, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), tem promovido diversas atividades voltadas à cultura oceânica. Um dos projetos de destaque é a Olimpíada Brasileira do Oceano (O2) voltada para todas as pessoas e instituições que integram o sistema formal ou não formal de ensino. Em cada edição, que costuma ocorrer anualmente entre junho a agosto, cada participante realiza uma prova de conhecimentos e elabora um projeto socioambiental e uma produção artística, cultural ou tecnológica.
Outro projeto que ocorre anualmente desde 2019 fortalecendo a relação do oceano na sociedade é a Semana do Mar de São Paulo, promovida pela Universidade de São Paulo (USP). Seu propósito é reunir projetos científicos, artísticos e educacionais, além de oferecer palestras, espetáculos, exposições de forma gratuita e acessível. Este ano de 2025, ela acontecerá entre 17 a 21 de setembro de 2025, no Memorial da América Latina, em São Paulo.
Há também eventos que, como o torneio de robótica, variam de tema a cada nova edição buscando abranger assuntos relevantes e diversificados para o público, é o caso da Semana Nacional de Ciência e Tecnologia (SNCT). Este ano, a 22ª edição SNCT será dedicada à cultura oceânica, o que demonstra a preocupação do país em promover espaços para aproximar todos os interessados em ciência e tecnologia, em especial professores, estudantes e cientistas dos desafios globais que atravessam o oceano, o qual tanto dependemos em nossas vidas.
Promover ações que fazem a ponte entre oceano e sociedade podem ser conectadas com muitas atividades para além do estudo tradicional, por meio de jogos, brincadeiras, criações artesanais, atividades de exploração marinha, como abordada no texto O oceano é para todos. Dessa forma, garantimos que pessoas de diferentes lugares, idades, raças, gêneros e classes sociais possam se envolver e engajar no cuidado com o oceano.
As opiniões e informações publicadas nas seções de colunas e análises são de responsabilidade de seus autores e não necessariamente representam a opinião do site ((o))eco. Buscamos nestes espaços garantir um debate diverso e frutífero sobre conservação ambiental.
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