Assim como se planeja o fim de semana conforme a previsão do tempo, o paulistano terá como programar suas atividades diárias levando em consideração os níveis de poluição atmosférica. O sistema é parecido com os mecanismos que alertam sobre a meteorologia e irá mostrar qual a qualidade do ar na grande São Paulo, em algumas cidades do interior do estado e na Baixada Santista. O modelo ainda está em fase de estudos, mas a previsão de implementação é até julho de 2007.
O ozônio (O3) será o foco do projeto por ser o gás encontrado em níveis mais preocupantes na região metropolitana. Mas faz parte da proposta mapear também poluentes como material particulado (MP), monóxido de carbono (CO), dióxido de nitrogênio (NO2) e dióxido de enxofre (SO2).
Lidar com as notícias de frentes frias anunciadas pela previsão meteorológica é fácil, basta abrir o armário e sacar um casaco. Mas uma vez conhecida a concentração dos poluentes para os próximos dias, o que se pode fazer para conviver com o veneno volátil? Não muita coisa. “As pessoas ainda não podem comprar ar engarrafado”, brinca Paulo Saldiva, médico patologista da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) e especialista em doenças provocadas pela poluição. Ainda assim, algumas providências ajudam a minimizar os impactos da má qualidade do ar na saúde, como deixar o carro em casa em dias de altas concentrações, oferecer carona, utilizar transporte coletivo e não ficar por muito tempo em locais de grande exposição aos poluentes (corredores e pontos de ônibus). “Precisamos de medidas mais radicais para reduzir o tráfego na cidade. Somente o rodízio de carros não é suficiente”, enfatiza o médico.
Carlos Lacava, gerente do site de Interpretação de Dados da Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (Cetesb) – parceira do projeto –, explica que os efeitos da exposição a 150 microgramas por metro cúbico de ozônio durante uma hora, por exemplo, são tosse seca, agravamento de doenças respiratórias, dor nos olhos, nariz e garganta. “Para se proteger dessa situação, os grupos sensíveis [crianças, idosos, cardíacos e pulmonares] devem reduzir esforços físicos pesados ao ar livre. Se a concentração desse gás for ainda maior, a recomendação pode ser até não sair de casa.” Desde junho deste ano, a companhia alerta, por meio de frases curtas em sua página na internet, quais os riscos e formas de se proteger de cada quadro de poluição, que varia conforme os poluentes e suas concentrações. Quando for possível prever dias antes os níveis dos gases, as recomendações serão mais eficazes, já que a população poderá se planejar com antecedência.
Etapas
Consolidado por equipe do Departamento de Ciências Atmosféricas da USP, o modelo matemático que vai permitir a previsão da qualidade do ar ainda tem de percorrer um bom caminho antes de se concretizar. Desde o início dos trabalhos, em 2004, a equipe já progrediu muito. Mas mapear as concentrações de ozônio, cruzar com dados meteorológicos e ainda traçar a distribuição das fontes poluidoras fixas e móveis da área abrangida pelo projeto – RMSP, Campinas, São José do Rio e litoral – não é tarefa fácil. “Os resultados, até agora, têm um ganho muito grande. A modelagem avançou bastante e temos um produto muito parecido com os de países como Austrália e Estados Unidos, onde existe a previsão da qualidade do ar. A maior dificuldade, daqui para frente, é reunir mais e mais dados”, avalia a professora Maria de Fátima Andrade, do Departamento de Ciências Atmosféricas do Instituto Astronômico e Geofísico da USP.
A implementação do sistema, conta ela, é um projeto de políticas públicas entre a universidade, a Cetesb e o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Recebeu 200 mil reais da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e, na metade de 2007, tem de apresentar resultados concretos – traduzindo, um modelo de previsão razoavelmente pronto para funcionar. As conclusões obtidas até agora dependeram de uma série de experimentos, como medições com balões de sondas de ozônio ; monitoramento das concentrações de poluentes em túneis, onde estão presentes diferentes fontes poluidoras veiculares; e medições de poluentes com a ajuda de um dirigível da Goodyear.
As experiências com a sondagem por meio de balões foram importantes para mostrar as concentrações de ozônio em diferentes altitudes. Isso porque os objetos voadores chegam a alcançar 30 km na vertical e permanecem na atmosfera por aproximadamente duas horas. Cada sonda custa mil dólares, voa protegida por uma caixa de isopor e não é reutilizável. “Um tempo atrás, um policial encontrou uma na rua e veio trazer pra gente [a equipe escreve na caixa de isopor dados como telefone e endereço da USP, o que permite que a sonda retorne]. Tem gente que se assusta, acha que é bomba”, comenta Maria de Fátima. As 20 sondas previstas pelo projeto já foram lançadas – 10 no outono e 10 na primavera. Agora, serão soltas na atmosfera outras 50 que captam apenas dados meteorológicos (clique aqui para baixar o vídeo de 3.4 MB).
O monitoramento com a ajuda do dirigível contribuiu para entender a dinâmica dos gases na capital paulistana. A bordo do “zepelim”, foram instalados cilindros especiais e sondas para quantificar ozônio, gás carbônico (CO2), monóxido de carbono e metano (CH4). Ao todo, foram realizados três vôos, que permitiram medições em diferentes altitudes ou na mesma altitude de diversos pontos da cidade. Dados compilados, o próximo passo é colocar na internet o modelo de site onde será possível prever a poluição. Ele até já existe, mas precisa de alguns ajustes antes de ser disponibilizado.
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