É frágil a situação fiscal do Instituto Chico Mendes (ICMBio). Ameaçado com o segundo corte orçamentário do ano, o órgão ambiental já comprometeu 92% de seu orçamento e criará gargalos se fizer novo aperto. O esforço do governo federal em atingir a meta do superávit primário levou a retirada, anunciada em julho, de R$10 bilhões do orçamento federal para 2013, atingindo quase todos os ministérios, inclusive o Ministério do Meio Ambiente, que perdeu R$ 246,8 milhões de seu orçamento atual.
De acordo com o site do Ministério do Planejamento, o Ministério do Meio Ambiente (MMA) perdeu R$246,8 milhões, 11,7% do seu orçamento de R$2,1 bilhões para o ano de 2013. Por sua vez, o Ministério do Meio Ambiente é obrigado a reduzir o orçamento de suas autarquias, entre as quais se encontra o ICMBio. ((o))eco tentou uma confirmação do valor do corte com o Ministério do Meio Ambiente, que não quis se pronunciar.
Na prática, o corte ainda não ocorreu, pois os órgãos ambientais já se consideram no limite da restrição de gastos. Antes, o Ministério do Meio Ambiente está tentando convencer o Ministério do Planejamento a cancelar a medida.
O atual orçamento do ICMBio está em torno de R$516 milhões, cerca de um quarto do total do Ministério do Meio Ambiente. Desses, mais da metade são destinados para despesas fixas, entre as quais a folha de pagamento dos servidores de R$266.9 milhões. Na despesas fixas, o ICMBio não pode mexer. Quando elas são subtraídas do orçamento, sobram R$211 milhões restantes (40,8% do total), que compõem o chamado orçamento discricionário, a parte sobre a qual o órgão pode decidir como gastar. Com ela, o ICMBio investe nas Unidades de Conservação, no pagamento de luz, água, internet, sinalização de trilhas, serviços e gestão.
O orçamento total do ICMBio sofreu dois cortes em 2013: o primeiro corte, em maio, veio através do Decreto 8021/2013, atingiu R$9 milhões, reduzindo os recursos livres para R$201 milhões. O segundo ocorreu já na metade do ano, em 21 de julho. Ainda não foi repassado pelo Ministério do Meio Ambiente, mas se seguir o mesmo percentual que o ministério sofreu (11,7%) reduzirá as verbas livres do ICMBio para R$177 milhões.
O problema é que R$182 milhões já estão comprometidos com contratos em andamento. Caso seja mesmo implementada, a nova redução deixará o caixa do ICMBio devendo R$5 milhões quatro meses antes do ano terminar. Mesmo essa redução seria o tiro de misericórdia, pois mesmo que não venha o ICMBio não termina o ano sem fazer reduções de gastos que comprometerão a gestão das Unidades de Conservação.
“A gente não toca até o final do ano com esse valor [R$201 milhões]. O que a gente tem disponível de orçamento não dá para fechar o ano nas mesmas condições”, explica Anna Flávia de Senna Franco, diretora de Planejamento, Administração e Logística do ICMBio.
De acordo com a diretora, o ICMBio está fazendo um grande esforço para conter gastos e isso inclui cortes em áreas essenciais, como a redução de postos de vigilante, de serviços de terceirizados, de diárias e de passagens. “Todas as diárias possíveis serão postergadas, a gente está tentando resolver os problemas com menos deslocamentos. Então, iniciativas já estão sendo tomadas. Só que, diante do quadro de restrição, elas não serão capazes de reduzir o impacto do corte que foi imposto”, afirmou.
A cúpula do ICMBio trabalha junto com o Ministério do Meio Ambiente não só para evitar o corte, como para obter do Ministério do Planejamento um acréscimo de R$16 milhões para esse ano. “Em 2008, a nossa receita era cerca de R$ 19 milhões e em 2012, ela subiu para R$72 milhões” diz Anna Flávia. Segundo a diretora, esse bom desempenho habilita o ICMBio a pedir um aumento de repasses do orçamento federal. As receitas próprias, provenientes de taxa de visitação, pregão de madeira, multas ambientais têm uma estimativa anual e o que passar disso fica retido no Ministério do Planejamento como esforço fiscal. Se estava previsto que o ICMBio arrecadaria, por exemplo, R$15 milhões de receitas de taxa de visitação em Unidades de Conservação e o órgão arrecada R$20 milhões, os R$5 milhões extras não ficam com o órgão.
| Veja aqui os valores detalhados do orçamento | |
Se o clima é de apreensão na sede do Instituto, em Brasília, nas Unidades, o tom é de revolta. A penúria orçamentária está fazendo ferver a comunicação entre servidores e chefes de Unidades de Conservação, que debatem por e-mails e grupos fechados nas redes sociais o impacto direto sobre suas Unidades.
Servidores se sentem abandonados
A situação de quem está em campo anda cada vez mais difícil. Os servidores se sentem abandonados e discutem medidas para chamar a atenção da opinião pública para o grave estado das UCs.
Há 3 semanas, ((o))eco tem falado com analistas ambientais de diferentes Unidades de Conservação do país e recebido mensagens com depoimentos sobre a situação peculiar de cada uma. Narrativas como ter o único carro da Unidade quebrado ou sem gasolina. Em uma UC com parte marinha a fiscalização foi cancelada por falta de barco. Outros contam que os cortes de vigilantes geram aumentos de crimes ambientais próximos às Unidades. Confidenciados a nossa reportagem, os exemplos pipocam.
Uns pensam em gravar um vídeo denunciando a situação, outros em se mobilizar e fazer um protesto. A percepção geral é de que as condições de trabalho só pioram porque o servidor aceita e dá um “jeitinho”, se vira como pode e as Unidades continuam funcionando do jeito que estão, sem condições de exercer seu papel.
Há contratos suspensos como os de brigadas de incêndios que atuam durante a época de seca. “Não apenas o contrato de brigadistas, há aluguel de helicóptero, de caminhão pipa, tudo suspenso”, diz um servidor que pediu para não identificado.
Na falta mão de obra, improvisa-se. Há analistas se virando em funções de vigilante ou pedreiro. Tudo em nome de manter as Unidades funcionando. Com a redução de funcionários terceirizados, o clima entre os servidores que ficam sobrecarregados só piora.
Parques abertos à visitação já estudam suspendê-la como ato político, para mostrar a falta de condições de trabalho. Este é o caso do Parque Nacional do Caparaó, localizado entre Minas e Espirito Santo, que considera paralisar as vistas por corte de pessoal terceirizado, a um grau que os gestores concluem ser impossível manter a segurança dos visitantes.
“Agora teremos que ensinar macaco a fiscalizar Unidade de Conservação, abrir trilha, limpar banheiro”, ironiza um servidor. “É a única maneira de ser mais criativo, como os burocratas pedem”, completa o outro. Ambos pediram para não ser identificados, mas a brincadeira resume bem a indignação que se espalhou dentro do Instituto Chico Mendes.
Em carta aberta aos servidores do ICMBio, a direção faz um apelo para que “Enquanto persiste a situação, a instituição tem orientado a todos que lidem com essas limitações da maneira mais justa e solidária possível, estudando as situações e as prioridades institucionais, e buscando minimizar seus impactos sobre os resultados pretendidos”.
O PIB brasileiro em 2012 atingiu a ordem de R$4,4 trilhões. Considerados baixos, os investimentos do Ministério do Transporte em 2012 foram de R$9,2 bilhões ou 0,21% do PIB brasileiro.
A missão do ICMBio envolve cuidar de 75 milhões de hectares de áreas protegidas, o equivalente a 8,8% do território brasileiro. Para isso, ele recebe 0,012% do PIB do país. E essa parcela está caindo.
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