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Autódromo: Justiça suspende audiência que iria decidir futuro da Floresta do Camboatá

Ação popular questiona a existência do Conselho Estadual do Meio Ambiente do Rio, diz que o órgão é clandestino e seus atos, nulos

Daniele Bragança ·
3 de agosto de 2020 · 4 anos atrás
Imagem do Campo de Instrução de Camboatá (Área 1) e de área militar anexa ao leste (Área 2). Fonte: Google Earth.

A juíza Roseli Nalin, da 15ª Vara de Fazenda Pública, suspendeu na noite desta segunda-feira (03) a audiência pública que estava marcada para a próxima sexta-feira (07) e que iria decidir o destino da Floresta do Camboatá, em Deodoro, no Rio de Janeiro terreno onde querem construir o novo autódromo da capital. A decisão é liminar e cabe recurso. 

A audiência é uma das etapas obrigatórias para a obtenção da licença prévia do empreendimento, que irá desmatar 200 mil árvores de um dos últimos redutos de Mata Atlântica em terrenos planos na capital.

“Grande vitória nossa”, comemora o advogado e ambientalista Rogério Rocco, um dos autores da ação popular que suspendeu a votação da audiência pública. O advogado Antônio Seixas foi o outro autor da ação. 

É a terceira vez que a audiência pública é adiada na Justiça. Em março, o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro conseguiu adiá-la, por causa da pandemia. Logo depois, o governo anunciou uma nova data, dessa vez online, para maio. O Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ) entrou de novo com um ação e conseguiu suspender a audiência junto à 14ª Vara de Fazenda Pública. Na ocasião, se questionou a ausência de regulamentação das audiências virtuais. A decisão foi mantida em instâncias superiores, mas em julho o ministro Dias Toffoli derrubou a liminar e autorizou a realização da audiência, marcada para ocorrer no dia 7 de agosto. A reunião foi suspensa nesta segunda-feira (03), a partir de uma ação popular que questiona a existência do Conselho Estadual de Meio Ambiente (Conema) do Rio, instância onde a reunião seria feita. 

“O Conselho Estadual de Meio Ambiente do Rio é um órgão clandestino; ele não existe, ele pratica atos que repercutem nos processos de licenciamento ambiental que estão em curso no Rio de Janeiro, de licenças que foram expedidas anos atrás, mas trata-se de um órgão clandestino na estrutura do estado. Tudo ao contrário dos mínimos requisitos de legalidade exigidos para a atuação do poder público. É uma coisa sem precedente, é uma coisa inacreditável o desprezos que esse governo tem com a estrutura de normatização da política ambiental do estado do Rio de Janeiro”, explica Rogério Rocco, em entrevista ao ((o))eco. 

A ação popular elenca uma série de irregularidades na existência do Conema, como, por exemplo, a criação do conselho ter sido por decreto, quando a constituição estadual determina, expressamente, que o órgão seja criado por projeto de lei, ou seja, passando pelo escrutínio da Assembleia Legislativa. 

Outra irregularidade é que o Conselho precisa ser paritário, ou seja, mesmo número de cadeira para o poder público e para a sociedade civil. A atual composição, definida em 2019, tem mais cadeiras para o governo. 

Além disso, as regras de votação virtual, definidas pelo próprio Conema, não estão sendo seguidas pelos próprios conselheiros, como o voto ser encaminhado por e-mail e as atas não divulgadas dentro do prazo previsto por decreto. 

Os advogados argumentam que o Conema não existe e que toda decisão tomada até agora pelo colegiado é nula, logo, não tem validade. Baseado nisso, pediram que a Justiça decidisse, liminarmente, pela suspensão da audiência sobre a Floresta de Camboatá, já que a decisão que sairia de lá “colocava em risco as regras de proteção ao meio ambiente com base na clandestinidade”.

A ação foi protocolada na sexta-feira passada (31) e a justiça decidiu pela liminar nesta segunda-feira (03). 

O que é/O que querem transformar. Imagem: Movimento SOS Floresta do Camboatá/Facebook.

O terreno onde querem construir o autódromo foi concedido pelo Exército Brasileiro à Prefeitura do Rio e é o único fragmento bem preservado acima de 100 hectares de mata de terras baixas na cidade do Rio. Segundo o Estudo de Impacto Ambiental (EIA), há quatro alternativas locacionais para a obra, que não precisaria desmatar uma área de 160 hectares. Em maio de 2019 a Rio Motopark venceu o certame para a construção do autódromo, que seria capaz de receber a Fórmula 1 a partir da temporada de 2021, após o término do atual contrato com São Paulo. O projeto prevê 14 meses de obras e um traçado de 5 quilômetros para provas de automobilismo e motociclismo. 

“O estudo de impacto ambiental aponta quatro alternativas locacionais. O Movimento SOS Camboatá até complementa: que o autódromo seja em outro lugar. Ele [o movimento] não é contra o autódromo, ele só quer que seja em outro lugar. Qualquer outra desses quatro alternativas locacionais é mais viável do ponto de vista ambiental que a Floresta de Camboatá, pois ela é a única que tem que desmatar floresta. Não tem nenhuma com 200 mil árvores e 18 espécies da fauna e da flora ameaçadas de extinção, com a importância ambiental que essa floresta tem. Por que eles insistem?”, pergunta Rocco.

 

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  • Daniele Bragança

    Repórter e editora do site ((o))eco, especializada na cobertura de legislação e política ambiental.

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