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Ativistas do Amapá protestam contra exploração na Foz do Amazonas

Falsa esperança de prosperidade e o temor pela contaminação de recursos hídricos e pelo risco de impossibilidade da pesca figuram entre argumentos dos que fazem frente contra o projeto

Michael Esquer ·
11 de julho de 2023

“Salve o Amapá”. Esta é a chamada do abaixo-assinado que ativistas do estado fronteiriço com a Guiana Francesa e Suriname lançaram para fazer frente contra a exploração petrolífera na Foz do Amazonas, bacia sedimentar que fica na porção oeste da margem equatorial brasileira. É nesta região onde a Petrobras tenta obter licença para perfuração marítima do bloco FZA-M-59, na costa da cidade de Oiapoque (AP). O pedido foi negado em maio, mas a estatal apresentou recurso ao Ibama no mesmo mês. 

“Não estão sendo levados em consideração o que o Parecer Técnico 128/2023 do Ibama aponta, sobre a falta de planejamento claro e amplo para uma eventual ocorrência de derramamento de óleo, que pode afetar seriamente o solo e água, fazendo com que comunidades e povos sejam afetados por uma tragédia sem precedentes, assim como toda população do Amapá em curto ou longo prazo”, afirma trecho da petição, publicada pelo coletivo Utopia Negra Amapaense

Na última terça-feira (4), ativistas da organização fizeram intervenções no centro e periferia de Macapá (AP). “Uma manifestação contra a exploração, pois sabemos quem são as pessoas que sofrerão as maiores consequências, caso o óleo vaze”, conta a ((o))eco Paulo Cardoso, diretor de projetos da Utopia Negra Amapaense. Também participaram do ato ativistas da Engajamundo e Associação Giramundo. 

Estratégica para a conservação da biodiversidade, a região da Costa Amazônica, onde situa-se a bacia sedimentar da Foz do Amazonas, abriga cerca de 80% dos manguezais existentes em território brasileiro. Importante produtor primário, esse tipo de ecossistema sustenta a base de teias alimentares costeiras e, consequentemente, é componente importante para comunidades locais, descreve nota técnica.

“A exploração de petróleo ameaça a subsistência das comunidades tradicionais e indígenas que dependem dos recursos naturais do rio Amazonas para a sua sobrevivência”, diz Cardoso. 

O ativista pontua que, mesmo com quatro hidrelétricas, o estado não se livra da crise energética – como viu o Brasil em novembro de 2020. “Nós estamos cansados de sermos explorados, o Amapá tem como realizar atividades e projetos que promovam uma transição energética justa e sustentável”, defende. 

Segundo Cardoso, a falsa esperança de prosperidade, sustentada pela alegada perspectiva de geração de empregos, figura entre os apontamentos daqueles que se posicionam contrários ao projeto. “Não há uma grande abrangência de cursos para a capacitação da comunidade, além de que essas empresas trazem seus funcionários de fora do território para atuar em cargos importantes, fornecendo apenas trabalhos exploratórios para nós”, aponta. 

Outros tipos de exploração, como as de minério e manganês, segundo o ativista, já afetam municípios como Santana (AP) e Serra do Navio (AP). Com a possível exploração na Foz do Amazonas também cresce, diz ele, o temor da contaminação de rios por produtos químicos, e, ainda, do risco da impossibilidade da pesca. 

“Não queremos mais uma exploração dentro do território, queremos qualidade de vida, saneamento básico, segurança energética e alimentar”, afirma o diretor de projetos da organização. Cardoso diz que o debate sobre a exploração da Foz do Amazonas é elitista e não conversa com a população negra, indígena e ribeirinha. “Os debates não são amplos”. 

Foto: Brunna Silva

Licença da Petrobras

O licenciamento do bloco FZA-M-59 teve início em 2014, ainda sob a titularidade da BP Energy do Brasil Ltda., empresa originalmente operadora do bloco. A Petrobras se tornou integral detentora do empreendimento seis anos depois, e em maio deste ano teve a licença negada pelo Ibama, como mostrou ((o))eco

“O bloco […] não está  isolado, mas relacionado a uma série de outros projetos na região. Apenas na bacia da Foz do Amazonas, estão em concessão outros oito blocos exploratórios e com processos de licenciamento em curso, além de 47 blocos em oferta permanente pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). Além disso, atualmente estão em curso sete solicitações de licença ambiental para atividades de pesquisa sísmica marítima, apenas na Bacia da Foz do Amazonas, inclusive com sobreposição espaçotemporal”, disse o parecer que recomendou ao Ibama o indeferimento da licença ambiental. 

Entretanto, ainda em maio, a Petrobras protocolou um pedido de reanálise da licença ambiental para exploração de petróleo na bacia da Foz do Amazonas, que ainda deve ser analisado pelo Ibama. O objetivo é que o órgão reconsidere o indeferimento da licença.

“A população amapaense, sobretudo jovens negros, esperam que o Ibama tome a melhor decisão pela não exploração do petróleo na foz do Amazonas porque a gente sabe que essa exploração pode causar impactos desastrosos na Amazônia”, diz Brunna Silva, integrante da Associação Giramundo. 

  • Michael Esquer

    Jornalista pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), com passagem pela Universidade Distrital Francisco José de Caldas, na Colômbia, tem interesse na temática socioambiental e direitos humanos

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Comentários 3

  1. Marco Melo Medeiros diz:

    Essa galerinha é a mesma que reclama quando o frete da loja x é duas vezes o preço do produto por conta da falta de infraestrutura do estado e desconexão com o resto do país. Não dá pra levar a sério.


  2. Jorge Henrique diz:

    Moro a 50 anos em Macapá.
    O que vejo são ongs servindo aos políticos,que fazem enriquecer com o voto da classe pobre que vive de cesta básica e de bolsas dos governos estaduais e federais.
    Enquanto o Estado se afunda cada vez na linha da pobreza,sem perspectivas de crescimento.
    Já se passaram vários governantes,e não se vê perspectivas de melhoras na população e bem de investimentos do governo federal.


    1. JOSE CARLOS ZINGRA diz:

      Eu gostaria que esse grupo publicasse qual o motivo de não mencionar a exploração de petróleo a 30 km da fronteira com o Brasil, na mesma bacia sedimentar.